quinta-feira, 30 de abril de 2015

Caminho



Caminho

Do caminho escolhido não há retorno depois de
tantos passos firmes dados numa mesma direção.
Não há decepções ou arrependimentos, há apenas a necessidade do caminhar sempre em frente...
Teimosa.
Não há calmantes ou analgésicos; nem chá. Há, apenas, o caminhar...
Movimento obrigatório e compulsivo movido de músculos voluntariosos e decididos.
Irracional.
Esta obrigação diária movida pela inexplicável paixão que move os cegos,
os sudos,os tolos e que me move,
alimenta-se de borboletas imaginárias e flores de cores inexistentes
vindas de um mundo criado, por capricho, por uma menina bailarina
que anda a bailar noite e dia nas nuvens que povoam
todos os anos de minha vida.
Tagarela.
Nau perdida sem destino certo, destinada ao vagar poético
em busca dos cantos, recantos, onde viva a fantasia,
onde toda a poesia possível de uma vida habita.
A paixão.


terça-feira, 28 de abril de 2015

Fernando Pessoa (meu mui amado)



Não sei quantas almas tenho

Não sei quantas almas tenho.
Cada momento mudei.
Continuamente me estranho.
Nunca me vi nem acabei.
De tanto ser, só tenho alma.
Quem tem alma não tem calma.
Quem vê é só o que vê,
Quem sente não é quem é,

Atento ao que sou e vejo,
Torno-me eles e não eu.
Cada meu sonho ou desejo
É do que nasce e não meu.
Sou minha própria paisagem;
Assisto à minha passagem,
Diverso, móbil e só,
Não sei sentir-me onde estou.

Por isso, alheio, vou lendo
Como páginas, meu ser.
O que segue não prevendo,
O que passou a esquecer.
Noto à margem do que li
O que julguei que senti.
Releio e digo: “Fui eu?”
Deus sabe, porque o escreveu.




Todas as cartas de amor…

Todas as cartas de amor são
Ridículas.
Não seriam cartas de amor se não fossem
Ridículas.

Também escrevi em meu tempo cartas de amor,
Como as outras,
Ridículas.

As cartas de amor, se há amor,
Têm de ser
Ridículas.

Mas, afinal,
Só as criaturas que nunca escreveram
Cartas de amor
É que são
Ridículas.

Quem me dera no tempo em que escrevia
Sem dar por isso
Cartas de amor
Ridículas.

A verdade é que hoje
As minhas memórias
Dessas cartas de amor
É que são
Ridículas.

(Todas as palavras esdrúxulas,
Como os sentimentos esdrúxulos,
São naturalmente
Ridículas.)


Mesmo que eu tivesse 10 vidas e que de todas elas eu me lembrasse, mesmo assim, não me cansaria de ler e reler Pessoa que tanto diz para mim sobre quem eu sou...

quinta-feira, 2 de abril de 2015

ContraTempo

Ando,
caminho de passo apressado e sem destino.

Passo a passo,

Repasso,

Ultrapasso.

Corro por uma estrada sem fim com pressa de chegar num futuro qualquer
completamente indiferente.
Levo no bolso o passado perdido e as lembranças de tudo aquilo que nunca chegou a ocorrer.
Saudades...
Minhas saudades.
Apressada, caminho correndo do tempo,
ao mesmo tempo,
que corro em direção aos teus braços, meu tempo. A tentar agarrá-lo, perco-me.
Fora do passo, do meu compasso, caminho
contra o fluxo natural da vida de coração costurado,
reestruturado,
a bater ao contrário. Frio.
No contratempo, bailo, contra o meu próprio tempo de pés trançados.
E fora de ritmo caminho com pés calados,
fingindo, feito o poeta, não sentir aquilo que deveras sinto.
Ando.