A Liniker
Liniker é uma força sobre o
palco. Pura energia em forma de braços e pernas bailarinos, dona de um corpo e
uma persona que nos confunde enquanto se explicita. Ela é a representação de
uma sociedade que por esses dias constrói em alto em bom som a sua realidade
que antes era apenas sussurrada pelas esquinas. Liniker é uma mulher transgênero
dona de voz poderosa e talento inquestionável. E ela reluz.
Tamanha segurança e postura construídas
por uma pessoa com pouco mais de 21 anos é um assombro que durante o concerto do
último sábado fez-me recordar Nina Simone. A época é outra, seguramente, e às
antigas questões somaram-se muitas outras, verdade. Contudo o poder de autoafirmar sua identidade
única numa sociedade que insiste em nos uniformizar e em nos classificar é a
mesma. Liniker, como Nina, apesar de todas as diferenças que existem entre elas,
impõe-se através de sua voz e da música que ela cria.
As questões de gênero, e qualquer
outra questão, poderiam ter sido deixadas de lado aqui, já que a música de
Liniker e os Caramelows é boa; muito boa. Som bem feito que vibra ao ritmo de
uma soul music atual e luminosa, cheia de letras inteligentes e bem escritas. Contudo,
não me é possível não notar que esta artista de outra forma, com outra essência,
não seria tão perfeita como é agora. Toda e qualquer incongruência que pode
parecer natural à ideia de que um menino nasceu para ser uma grande cantora
brasileira desaparece quando ouvimos e vemos Liniker.
Liniker ter nascido para ser uma cantora de
voz grossa, melodiosa e feminina mostra-se a única realidade possível e, por
isso, é muito bom tê-la, como temos a tantos outros meninos e meninas, a
mostrar-se agora. Pois, apesar de vivermos dias ainda difíceis, não há como ignorar
que esses dias também nos trazem uma quantidade ampla de novas possibilidades. Chegou
o tempo de ensinar e aprender que somos múltiplos e muito mais do que parecemos
ser.
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