antes do encontro
procurar uma escada de madeira
dando para o abismo
é uma ação que só pode acontecer
nesta língua
estranha e numa cidade cortada
por um rio
que fique no meio dos dois
(quando um precisa ir embora
para sempre)
mas um dia ela chega
com a pergunta:
— o que vem à sua cabeça
quando digo a palavra
amor?
um dia desce no meio do dia
e vê. e um dia vê a peça lilás
sobre a quina da mesa
quando volta. ele diz saltar.
saltar para fora.
e atravessa na esquina
procurando a escada. depois diz
que quer saltar
para fora desta canção.
mas um dia chega com
a pergunta:
— o que vem à sua cabeça quando
digo a palavra amor?
e ela responde
que amor em japonês
se diz /ai/.
e, de repente, um branco.
as linhas se tornam cada vez mais
quebradiças. um banco parado no
meio da cena,
um quadrado iluminado e a frase
mais longa
que ele me disse nos últimos
seis meses.
o que significa um cachecol
vermelho
pinicando sozinho?
uma abelha, pensa, mas o cachecol
pinicando,
voando como uma abelha, talvez um
inseto
estridente, incidente para ouvir
quando ele
chegar e vir.
agora sobrou apenas a estática
tremendo e você a leva de volta
até o barco:
— a estática?, pergunta, você
lembra
daquela vez? e ela fica parada na
chuva
com o colete salva-vidas
esperando
alguma coisa acontecer.
[aqui o telefone
vibra na bolsa e um parêntese
para dizer que não sabe onde está
mas é longe
não sabe onde está mas é frio
não sabe onde está mas é quase.
ao ouvir a voz,
parece de verdade,
e então ele levanta e me diz algo
sobre o fim
ou sobre o sim
e toca na tela uma imagem
do filme]
de Marília Garcia