No ano passado, depois de uma pesquisa feita ao redor de nosso mundo, que já não é tão “grandes coisas” assim, os brasileiros foram eleitos o povo mais simpático do planeta. E isso, na época, me fez sentir até um calorzinho cá dentro do peito, afinal isto de ser simpático é algo bom de ser, não? Realmente não podemos negar que somos um povo alegre e receptivo, de conversa fácil e amigável, e que basta-nos alguns minutos para que nos tornemos íntimos de todo e qualquer um. Amamos abraçar, beijar, dançar e cantar e, logo se pensa: Olha lá que povo simpático, não? O pior é que as coisas não são bem assim não.
Claro que somos simpáticos por natureza, contudo, vira e mexe, parece que nos confundimos entre a simpatia e a apatia tanto quanto entre a gentileza e o jeitinho torto que só pertence ao brasileiro. Parece haver um caminho estreito demais aqui por onde circulam o correto e o mais que duvidoso e, por isso, estes dois se confundem em nossa moral tropical. Meio míopes ou embriagados pelo calor, seja lá o que for que nos sufoca a razão e a visão, andamos fingindo não ver o que se passa por aqui, cada qual no seu papel: cínicos e parvos, ambos a fingir que tudo está bem neste país.
Claro que ficam muito melhor os cínicos, mestres do jeitinho brasileiro e que se riem o dia inteiro; homens e mulheres que, muito mais que amorais, chegam às vias da imoralidade como algo corriqueiro e banal, afinal os fins justificam todos os meios quando a meta é o poder e o dinheiro. Vivem sem gota de preocupação num país onde a justiça não funciona e não há oposição que preste, pois que quase todos estes já foram comprados e vivem nos bolsos daqueles. Aos cínicos não há nada a temer. Bem, nada além da justiça divina, mas esta tarda, então... Então, vemos os cínicos, à La Palocci, em entrevistas na televisão fingindo não fazerem nada de errado, com cara de santo barroco, enquanto dão explicações falsas e mirabolantes sobre o que nós, os parvos, fingimos não ver tão claramente assim.
Sim, não há o que dizer de um povo que sabe que é roubado diariamente e não faz nada mesmo assim. Muito ao contrário continuamos a pagar nossos impostos corretamente e sem atrasos bem quietinhos e caladinhos em nossas casas porque é isto que se espera de um cidadão criado tal gado com palas, como temos sido nós. Não somos bons, não senhor. Somos um bando de parvos, e dos bons! Porque não há verdade esfregada em nossa cara que nos faça reagir, isso não. Dá-nos um carro novo, uma boa casa, algum dinheiro e um passaporte para que possamos fugir vez ou outra daqui, e pronto: somos mais do que felizes assim.
A luta não faz parte de nosso vocabulário diário, onde não cabem também a indignação, a revolta, a ação ou a consciência social. Definitivamente não! Somos um povo simpático e, por tanto, cabe-nos apenas sorrir. Mesmo que este seja um sorrisinho bem do amarelo, pois é isso que a pátria espera de nós. Viva o país dos simpáticos!
Uma boa semana sem consciência pra todos nós.
A música “A Dança dos Parvos”, da banda portuguesa “Os Dias de Raiva”, não foi feita para nós, mas veste como luva, pois parece que nossos colonizadores andam a sofrer dos mesmos males que nós. A bancarrota nos espera a todos nós. Que futuro é esse?
Dança dos Parvos
Dias de Raiva
Come, bebe, fode.
Estica o coração, é um músculo,
Tu sabes que ele pode.
Eles dizem "fuma, bebe, fode".
Enquanto danças a Dança dos Parvos,
Porque ela sacode...
Qualquer preocupação que te perturbe o espírito,
Qualquer dúvida ou pergunta que questione o mérito
De tudo aquilo que levámos milénios
A aperfeiçoar...
A sofisticação da hipocrisia (2x)
Subliminar (2x)
A purificação da mediocridade que nos define.
Ah pois é...
A aceitação da miséria social,
Encerrada num código PIN
E se por acaso caíres no erro ou luxo de sentir e de pensar...
Vai ao médico.
Ele receita um ansiólitico.
Dez minutos, diagnosticou-te mentalmente paralítico.
Vendo bem, pr'a que é que te hás-de dar ao trabalho de pensar
Seja o que for?
Há quem o faça por ti muito mais e muito melhor.
Deixa-te estar, caga nisso, a vida são dois dias que estamos aqui!
Bebe um copo, levanta-te e sorri!
Há quem morra de fome,
Mas isso não nos toca a nós!
Por isso canta comigo a uma só voz!
Come, bebe, fode.
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