Diário da Torre
Depois de uma
semana fechada sozinha na torre o que posso dizer é que não tenho qualquer
vocação para Rapunzel. Isso de estar trancada é muito mais difícil do que
parece, e a verdade é que apenas depois de passar por algo assim conseguimos
compreender o que realmente significa não poder colocar os pés na rua para
viver. A nossa casa será sempre refúgio onde nos sentimos bem. Porém, é fora
dela que grande parte de quem somos respira e acontece a vida.
Para além da
loucura que é estar trancada, é difícil ver a loucura que é a vida ser virada
de ponta cabeça do lado de fora da janela. É assustador imaginar quem
perderemos, quantas pessoas perderemos, e o que será a vida com tanta ausência
dentro de nós. Apavorei-me como nunca antes me sentira apavorada. E, no meio da
semana, surtei. Entrei em pânico pensando no tamanho da desgraceira que nos
espera. Travei; congelei dentro de mim.
Parei, esqueci o
mundo um pouquinho e respirei durante um dia. Respiraram comigo os amigos e a família
que estavam ao meu lado desde longe. Melhorei, mesmo que quase nada tenha mudado. Não sei o que acontecerá e para mim, que
geralmente finco os pés no chão e controlo toda a minha vida, a incerteza
incomoda. Hoje apenas sei que cá por dentro está uma tristeza pesada, e a certeza de que choraremos muitas vezes.
Talvez muita
gente tenha surtado, afinal, não estávamos preparados para uma pandemia como as
vistas no cinema e que pareciam pertencer a tempos medievais. Ainda não
estamos. Contudo, depois do primeiro susto começo a perceber que estamos a nos
organizar. Agora, apesar de toda a dificuldade que virá, já percebo que
lutaremos juntos. Aqui é: cada um na sua casa e, ao mesmo tempo, todos juntos.
p.s. Eu fugi para
casa do meu pai. Ufa... agora consigo respirar mais tranquilamente com um
quintal para ver o sol e com a certeza de que o papito não vai se aventurar num
supermercado por aí. Seguimos juntos.
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