Pela primeira
vez em anos, muitos anos, todos os anos, fez-se o silêncio. Completo e vazio;
inodoro. Pela primeira vez em sua vida não havia música, ela desligara o rádio
e ouvia o ruído do motor do carro. Uma bicicleta passou no chão úmido. Silenciosa
e quase transparente uma pequena aranha passeava por um mundo que parara de
girar aos olhos de Ana. Os olhos seguiam a pequena aranha pelo painel do carro,
por detrás do volante. Ana não se mexia, apenas a pequena aracnídea o fazia.
Ela era muito
pequena e branca, insignificante. Porém parecia mais importante do que qualquer
coisa naquele instante e Ana invejou-a. Invejou sua inconsciência e sua vida
simples e completa em si mesma. A cabeça lhe doía e pesava como se fosse o
crânio de um elefante, e ela apenas conseguia pensar que sentia uma inveja
piegas da aranha.
O Mundo inteiro estava
tão imensamente vazio e confuso naquele silêncio. Ele havia se quebrado, quando
a pequena mulher compreendeu que todos seus desejos, seus sonhos e seus planos não
passavam de belas alucinações. Ana compreendera, claramente, que estava louca;
ela era louca. Louca destas loucuras silenciosas e inofensivas, mas percebia-se
louca. Ana acreditara no que não existia, e mesmo depois de ter tido a
comprovação cabal de que nada havia sido verdadeiro, mesmo neste momento, ela
acreditava no que jamais existira. Estava definitivamente louca.
A aranha
continuava a passear, e o semáforo já mudara sua cor algumas vezes. Àquela hora
não havia carros na rua; apenas Ana, a aranha e uma esporádica bicicleta que já
se fora há vários minutos atrás. O reino do silêncio imperava num mundo onde
não se podia mais fazer música, o mundo de Ana tornara-se mudo.
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