Nossos almoços e jantares no Chile, comida que amei porque era fantástico o sabor da companhia |
Sem muito paladar, quiçá conhecimentos, para apreciar
qualquer comida como percebo que alguns o sabem fazer, fico à deriva do sabor
exato e cheio de detalhes. Desconheço o que sentem as pessoas que têm esta
espécie de sabedoria conectada às papilas gustativas e que podem com algumas
garfadas detalhar ervas e ingredientes, detalhes que me passam tão despercebidos
que parece-me que faltam partes da minha língua. Talvez o vício do café muito
quente tenha lá o seu preço e tenha queimado pra sempre as minhas capacidades
para o sabor, talvez. E, por isso mesmo, por esta falta de paladar, tornam-se,
para mim, deveras relativos o valor e a qualidade de qualquer prato. Não sei
apreciar comida, apesar de gostar de comer e, por isso, nestes dias fiquei
pensando no sabor que a comida tem pra mim. Eita mulher sem muito pra fazer,
não?
Bom, na verdade, tenho sim meu tempo egoísta, aquele tempo
que só conhecem as mulheres que não tiveram filhos e que por isso mesmo têm
tempo pra pensar naquilo que não interessa muito a ninguém. Ou como dizemos por
aí: fico mesmo a pensar na morte da bezerra. A procurar sarna pra me coçar e a
encontrar pêlo em ovo. (p.s. Dá-me uma raiva esta reforma ortográfica e meu
pelo, rebelde, ainda leva acento). Bora voltar ao assunto em questão, que não é
pêlo, mas comida. Aliás, meio nojento isso de misturar pêlos e comida, sim? Credo!
(sorriso) Em sério, agora, bora encerrar a digressão. A realidade é que por
estes dias percebi que o gosto da comida para mim tem muito mais relação com
minha memória afetiva do que com o gosto real que ela carrega em si. Explico-me.
Gosto de comer aquilo que me lembra de algo, que me lembra de
um tempo passado, que me remete a alguém, que evoca memórias guardadas com
tanto carinho que têm, elas sim, um sabor tão bom que não consigo descrever. Portanto,
não me lembro do gosto de um prato de um restaurante e não sei compará-lo a
outro como fazem outros. Sei dizer que amava os pães da minha avó Luiza que os
fazia sem receita e que eram acompanhados de café forte nas tardes de domingo.
Sei que os amava porque eles vinham em companhia da risada sonora e debochada
de dona Luiza, de todos nós, filhos e netos, ao redor da mesa e dos meus avós
me chamando de Stelinha.
Por isso também, sei que morro pelos bolinhos de arroz da
minha mãe, que nem cozinha tão bem assim, mas que sempre nos mimou como ninguém
e o faz até hoje. Sinto-me menina ainda quando como sua comida, ou quando a
vejo acordar cedo para fazer o meu café pela manhã. Nestes momentos sou menina pequena
e protegida e este é o sabor mais raro a esta altura da minha vida. Nada tem um
gosto melhor do que os bolinhos de arroz da minha mãe. Nada neste Universo
nunca terá.
Por razões parecidas, mas com um toque de sofisticação na
receita, não há nada mais doce que os bolos que faz o meu pai. Sim, tenho um
pai prendado. Sorriso. E, apesar de sempre ter sido um homem muito sério, um
tanto duro e fechado durante toda a minha infância e adolescência. Apesar do
medo que ele causava em minhas amigas e nos meus poucos namorados, apesar disso
tudo, não houve um dia nesses anos todos que ele tenha me deixado sozinha. Nem um
dia sequer. E quando volto à casa de meus pais, de visita, me encanta ver seus
bolos macios feito algodão, suaves e saborosos como nenhum bolo que eu tenha
comido pôde ser. E sinto todo o amor que meu pai, meio sem jeito, nos deu
durante toda a sua vida.
Sim, adoro comer. Mas isso quando estou na companhia daqueles
que amo, que comer na solidão jamais me dá qualquer prazer. Detesto isso de
comer sozinha. Então, que venham muitos almoços e jantares com os amigos e a
família que todos os quilos ganhos com eles serão sempre bem vindos!
Um beijo a todos e bom almoço, cheio de carinho, neste
domingo.
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