domingo, 30 de setembro de 2018

meu mundo





 meu mundo



um mundo que aos poucos e sem descanso

deixa de ser meu

ou nosso

dobramos errado n'alguma esquina

e perdidos vagamos

zumbis dormidos disfarçados de seres humanos à la walking
dead

seguimos num mundo paralelo

desumano

em nosso Apocalipse moderno

sem direito a perdão ou ressureição

o dinheiro grita e não nos escutamos

os extremistas gritam e não enxergamos

já não percebemos que pertencemos a mesma espécie de gente

que dentro de todos o sangue é vermelho e quente

que há ossos e carne

e uma alma

retalhada por tiros de AR-15

balas perdidas que encontram todas as gentes.

domingo, 23 de setembro de 2018

Nada







Nada

Como se tudo fosse assunto antigo, o mundo para mim anda a apresentar-se repetitivo e desinteressante. Nada inspirar-me como dantes. De um repente, sem eu saber dos porquês e sem senões converti-me em mera observadora de tudo que passa sem paciência para as tragédias ou apetite para as tramas. O fato é que cansei-me de tudo.

Cansei-me das discussões acaloradas e de lutar por aquilo que penso ser o certo, cansei-me da crença e da busca sem descanso por um sentido real e verdadeiro para a vida. Direitos iguais, a busca por um mundo mais justo para todos, e todo o etc. e tal que acompanha àqueles que gostariam que vivêssemos em sociedades que não privilegiassem poucos, tais coisas não existem e nunca existiram para além da nossa parca e vã capacidade de compreender a realidade. O mundo pertence aos que têm dinheiro e ponto final.

Então, seja porque assim a idade pede-me, pois que a todos chega a idade da descrença e do cinismo, seja porque os que mandam nesse mundo andam descarados num grau superlativo e batem, sem dó nem piedade, forte demais, nas nossas ilusões. A verdade é que toda e qualquer solução proposta por qualquer um que tenha o poder e o dinheiro ao seu lado soa-me como uma falácia construída para nos distrair. Um imaginário mundo de promessas que nunca se realizarão.

Aqui em Terra Brasilis, no meu quintal, tudo anda de mal a pior, e andamos a descer a ladeira sem direito a freios; descontroladamente. Em alguns dias teremos eleições neste país onde a única coisa que parece ter evoluído sem direito à marcha à ré é o tamanho da violência com a qual convivemos. Estamos em guerra, armados de fuzis e bombas a assassinar toda e qualquer possibilidade de futuro. E eu, como muitos aqui, votarei sem esperar que nada mude, pois parece-me que o nada é tudo que nos resta.


Em alto e bom som


segunda-feira, 17 de setembro de 2018

Entretenimento? - Música Universalmente Individual



Música Universalmente Individual

Entretenimento?, o novo disco do Senhor Carlos Nobre, a.k.a Carlão, nasceu no último dia 14 ainda antes de o dia amanhecer. Boa música veio ao mundo neste data para a alegria dos ouvidos de muitos e para o completo deleite dos meus olhinhos que, depois de tantos anos, (quase 10 deles!), continuam a encantar-se profundamente com as letras e as palavras deste tuga que a mim me fez apaixonar-me pela música lusa e pelo país que, até então, não figurava no mapa do meu mundo particular.

Sem poder ser imparcial, pois que a imparcialidade não será jamais companheira da paixão, Entretenimento? traz consigo o melhor do gênero e cumpre com esmero as funções da arte: catarse com direito a reflexão existencial e divertimento num só pacote. Pois, Entretenimento?, assim agarrado a um ponto de interrogação, nos encara de frente a questionar-nos sobre a frivolidade da existência humana moderna. Afinal, tudo vale a pena se, e apenas se, a alma não for pequena, não?

Muito para além do Bojador, Carlão definitivamente lançou-se ao mar e ao mundo no novo disco. Muito menos introspectivo, renascido depois do mergulho em seu mundo particular nos Algodões e da reflexão sobre si próprio em Quarenta, neste disco, apesar de sua escrita refletir essencialmente o homem Carlos, vemos que ele anda a olhar para mais além no horizonte.

Carlão definitivamente mostra que não é um MC, e sim um inteligente e poético representante da música popular portuguesa moderna. Um artista a ressaltar as qualidades únicas de tudo que nasce de misturas e por isso faz-se único, afinal o que é mestiço é diferente do “normal”, sobressai no e do meio e mostra-se impossível de copiar.  

Sendo assim, em Entretenimento? encontramos toques de Bossa Nova, reflexos do Fado, dicas de Hip-Hop, música eletrônica e tudo aquilo que o Seu Carlos sentiu fazer sentido cantar. No dia 14 de Setembro nasceu uma obra única e que está cá fora para ser ouvida com atenção. Eu de minha parte elegi as minhas favoritas: Entretenimento - Cerejas, Só isso – Repetido – Bebe um Copo – Na Margem -  Foge de Mim, (nesta ordem). Mas essa é uma seleção minha, mui particular e não vale para os outros o que para mim valerá, afinal no mundo musical universalmente particular de Carlão cada um tem o direito de criar um país só seu.






quarta-feira, 12 de setembro de 2018

Jogo sem Rima



Jogo sem Rima

Leio poesia enquanto assisto
Silenciosa
a uma partida de futebol.
Nenhum gol no horizonte e nenhuma emoção mais forte nas letras,
melhor assim;
que assim seja!
Enquanto a vista direita deita-se na página - preto no branco dançando,
o olho esquerdo esforça-se para acompanhar a bola,
Maltratada,
a correr com sofreguidão pelo gramado verde.
Resta pouca poesia no futebol nos campos da minha terra,
falta-nos vocabulário e graça,
e sem ritmo e rima,
minguada, suspira sem fôlego a ginga.
Sobra, então,
para a completa tristeza do olho esquerdo,
um atropelamento de palavras que nada comunicam.
Passes infrutíferos,
dezenas de cruzamentos mudos
e a minha defesa a gritar em alto e bom tom: aqui não!
Como começou tudo termina e o placar embalado pela ode à inércia
Cochila.
O meu time venceu.

domingo, 9 de setembro de 2018

#Demasia




Compra caro e mostra tudo,
é Natal e entrudo
tou-te a ver por um canudo
Não me iludo, e contudo
se eu assisto ao desfile
não me fecho nesse deal
como um cão no canil
O rei vai nu
Diz-me tu
que vudu
faz que um homem fique cego
Diz-me tu
quem és tu
Gabiru
que em vez da vida
muda o espelho
Morre novo
e mata o velho
Sem um credo
ou evangelho
bicos de pés
sempre a ver se estás
bonito na fotografia
Tanta pose todo o dia
cheira-me a posologia
#demasia
É tudo imagem, ideia e conceito
até encenas a falha, o aparente defeito
A prever o efeito
em cada gesto proveito
Admiro o teu jeito
espontâneo nem o trejeito
O mundo gira e tu atrás
Sempre a ver se se estás
Bonito na fotografia
Toda a hora todo o dia
#demasia

Cirurgia plástica 24 por 7
direto na net
aquele act no react
Entretenimento é rei
E todos prestam vassalagem
Quem morreu eu não sei
Mas gostei da homenagem
A namorada é influência contratada
a namorada é influência bem tratada
Unboxing de vaidades
entre celebridades,
vê-me esse feed!
“Oh meu deus somos duas metades”
Não, são duas beldades:
o mesmo lado da moeda,
o mesmo dedo, a mesma merda,
o mesmo vírus que leveda
Um dia acaba-te essa mama,
és pouco mais que um holograma
preso na fama que enreda
Se vais com Deus no comando
e ele é pai não é padrasto
Vê se ampara a tua queda
Só que a ti ninguém arreda...
Tira só selfie com o dreada ; )
O mundo gira e tu atrás
Sempre a ver se se estás
Bonito na fotografia
Toda a hora todo o dia
#demasia

quarta-feira, 5 de setembro de 2018

Com vergonha de tudo e mais um pouco




Com vergonha de tudo e mais um pouco


Ando cidadã cabisbaixa, com vergonha minha, e nada alheia, de tudo que se passa na minha mui amada Terra Brasilis; meu noutros-tempos-porto-seguro. Pois, minha Pindorama, berço de gente sem muitos modos e detentora de todo o respeito por tudo que tem sentido profundo nesta vida e vale a pena, apesar de não valer muitos dinheiros, tem sofrido por demais em nossas mãos.

Feito cachorro louco, andamos alienados a tentar morder o próprio rabo e damos milhares de passos sem sair do lugar. Mergulhados numa crise gestada por nós mesmos, pela nossa maldita e crônica falta de compreensão do que vem a ser cidadania e sociedade e do quão fundamental elas são, temos visto a qualidade da existência em nosso país dar marcha à ré. Retrocedemos, à la Martin Macfly sem saber que isso era possível, para um passado mais injusto.

Pois, de futuro incerto e ameaçado, nos sentíamos um tanto desgovernados. Contudo, depois do último domingo, estamos a nos sentir total, completa e irrestritamente abandonados e à deriva num mundo desconhecido. Já sem futuro, aprendemos depois do incêndio absurdo e irresponsável no Museu Nacional no Rio de Janeiro que estamos a perder o nosso passado. E eu, como grande parte dos brasileiros, sinto-me enlutada a observar o desaparecimento do que chamo de minha nação.

Todas as obras de arte, artefatos, o conhecimento e a História perdidos no último domingo formavam parte do que somos nós desde sempre; desde antes de nos sabermos como brasileiros. No dia 03 de setembro de 2018 grande parte de nós foi apagada deste mundo sem possibilidades de volta não por falta de dinheiro como parece-nos num primeiro momento, e sim pelo descaso e pela falta de caráter de um povo e seus líderes que não dão qualquer importância à sua cultura e história.

Eu, de minha parte, sinto-me órfã como se meu país tivesse sumido do mapa e, definitivamente envergonhada de ser brasileira; a Candelária, Eldorado dos Carajás, Mariana, o Museu Nacional, a violência que nos mata todo santo dia...



sábado, 1 de setembro de 2018

mudo



mudo

Saíram em disparada, boiada em desespero,
escapando-me pelos dedos
todas as palavras.
Restaram poucas letras que não chegam
a poder
ou a querer
dizer coisa alguma que à pena
valha.
Esconderam-se as opiniões,
faleceram melancólicos os infinitos
e teimosos comentários,
empalideceu
todo e qualquer recado cheio de sentimentos
tresloucados
que um dia respirou demoradamente
dentro de  mim.
De pouca ou nenhuma serventia mostram-se
os dedos mudos
e a língua sem qualquer habilidade para o tato.
Hoje,
depois de tanto tempo passado
(dias, meses, anos...
uma infinidade de tempo a redigir uma Ode àquilo que um dia poderia ser a fantasia mais
real desta vida),
emudeço
lentamente.