CABELUDINHO
9.
Entrar na Academia já entre
mas ninguém me explica por que que essa torneira aberta
neste silêncio de noite
parece poesia jorrando...
Sou bugre mesmo
me explica mesmo
me ensina modos de gente
me ensina a acompanhar um enterro de cabeça baixa
me explica por que que um olhar de piedade
cravado na condição humana
não brilha mais que anúncio luminos?
Qual, sou bugre mesmo
só sei pensar na hora ruim
na hora do azar que espanta até a ave da saudade
Sou bugre mesmo
me explica mesmo:
se eu não sei parar o sangue, que que adianta
não ser um imbecil ou borboleta?
Me explica por que penso naqueles moleques
como nos peixes
que deixava escapar do anzol
com o queixo arrebentado?
Qual, antes melhor fechar essa torneira, bugre velho...
de Manoel de Barros
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