terça-feira, 10 de julho de 2012

A vida escondida




Ontem ao terminar a leitura de mais um livro, o romance A Casa dos Espíritos de Isabel Allende, senti a tal mescla de sentimentos que me acompanha sempre que meus olhos se põem na última página de um bom livro: a satisfação tranquila pela missão cumprida de ter visto de cabo a rabo mais uma estória, e o pesar melancólico de saber que a minha cumplicidade com os homens e mulheres que respiram naquelas páginas deixará de ser um prazer cotidiano. Não ouvirei mais aquelas vozes em sussurros aos meus ouvidos, e a saudade fica comigo.

É bem verdade que nem todos os livros nos tocam da mesma forma, e assim jamais pode ser. Há vezes nas quais nos arrastamos pelas páginas de um livro que não consegue nos prender e, mais por orgulho ou teimosia, terminamos pesadamente, e com alívio sincero, a passagem por suas linhas finais. Por outro lado, em outras vezes, nos sentimos tragados pelas palavras de uma estória, escravos sedentos pelo descobrimento dos próximos acontecimentos, de tal forma que nos dói fechar o livro e abandoná-lo até o próximo momento egoísta de estar a sós com esta paixão novamente.

E, tal como toda forma de arte, a grandeza e o valor de um livro nunca deixarão de ter um quê de subjetivo e, por tanto, relativo. O bom livro, muito para além das qualidades literárias que ele pode ou não ter, é assim classificado muito de acordo com o prazer que este dá aos olhos de quem o lê. Assim, que no mesmo dia de ontem, senti-me ofendida pela qualificação de medíocre dada ao meu querido Carlos Drummond de Andrade por um jornalista na televisão. E, me perguntei: como assim, Drummond uma porcaria? Que heresia. Entretanto, tão certo quanto eu tenho o direito de ser apaixonada por tudo que o mineiro Drummond escreveu, outro leitor tem todo o direito de não gostar nem um pouco do todo que ele produziu. E desta forma sempre será.

Seja como e porque for, ganhamos muito quando lemos um bom livro; um livro que nos ensina algo, que provoca nossa mente, e nos comove. Ele nos faz refletir sobre sentimentos, fatos, e sobre as razões humanas para ações que não são nossas, mas que experimentamos no cumplice momento de entrega à leitura.  E aprendemos mais sobre o mundo e sobre quem somos através de uma catarse literal.

Quanto ao meu último romance, A Casa dos Espíritos, posso dizer que valeu muito a pena para mim, sem qualquer sombra de dúvida.  Seus personagens viveram comigo por um mês inteiro e me fizeram sorrir, chorar e me sentir tão próximo a eles que quis, através da fé cega, mudar o escrito para que o sofrimento destes fosse diminuído. Neste momento, sinto saudades daqueles latinos apaixonados, passionais e um tanto lunáticos. E fica mais claro para mim o porquê de chamarmos de romance este gênero literário, já que a paixão por ele concedida me chega clara e viva.

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