Ontem ao terminar a leitura de mais
um livro, o romance A Casa dos Espíritos de Isabel Allende, senti a tal mescla
de sentimentos que me acompanha sempre que meus olhos se põem na última página
de um bom livro: a satisfação tranquila pela missão cumprida de ter visto de cabo
a rabo mais uma estória, e o pesar melancólico de saber que a minha
cumplicidade com os homens e mulheres que respiram naquelas páginas deixará de
ser um prazer cotidiano. Não ouvirei mais aquelas vozes em sussurros aos meus
ouvidos, e a saudade fica comigo.
É bem verdade que nem todos os
livros nos tocam da mesma forma, e assim jamais pode ser. Há vezes nas quais
nos arrastamos pelas páginas de um livro que não consegue nos prender e, mais
por orgulho ou teimosia, terminamos pesadamente, e com alívio sincero, a
passagem por suas linhas finais. Por outro lado, em outras vezes, nos sentimos
tragados pelas palavras de uma estória, escravos sedentos pelo descobrimento
dos próximos acontecimentos, de tal forma que nos dói fechar o livro e
abandoná-lo até o próximo momento egoísta de estar a sós com esta paixão
novamente.
E, tal como toda forma de arte, a
grandeza e o valor de um livro nunca deixarão de ter um quê de subjetivo e, por
tanto, relativo. O bom livro, muito para além das qualidades literárias que ele
pode ou não ter, é assim classificado muito de acordo com o prazer que este dá
aos olhos de quem o lê. Assim, que no mesmo dia de ontem, senti-me ofendida
pela qualificação de medíocre dada ao meu querido Carlos Drummond de Andrade
por um jornalista na televisão. E, me perguntei: como assim, Drummond uma
porcaria? Que heresia. Entretanto, tão certo quanto eu tenho o direito de ser
apaixonada por tudo que o mineiro Drummond escreveu, outro leitor tem todo o
direito de não gostar nem um pouco do todo que ele produziu. E desta forma
sempre será.
Seja como e porque for, ganhamos
muito quando lemos um bom livro; um livro que nos ensina algo, que provoca
nossa mente, e nos comove. Ele nos faz refletir sobre sentimentos, fatos, e sobre
as razões humanas para ações que não são nossas, mas que experimentamos no
cumplice momento de entrega à leitura. E
aprendemos mais sobre o mundo e sobre quem somos através de uma catarse literal.
Quanto ao meu último romance, A Casa dos
Espíritos, posso dizer que valeu muito a pena para mim, sem qualquer sombra de
dúvida. Seus personagens viveram comigo
por um mês inteiro e me fizeram sorrir, chorar e me sentir tão próximo a eles
que quis, através da fé cega, mudar o escrito para que o sofrimento destes fosse
diminuído. Neste momento, sinto saudades daqueles latinos apaixonados,
passionais e um tanto lunáticos. E fica mais claro para mim o porquê de chamarmos
de romance este gênero literário, já que a paixão por ele concedida me chega clara
e viva.
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