Nada, nem mesmo milhares de anos,
poderia ter me preparado para aquilo que vi ao entrar na Sagrada Família em
Barcelona. Não consigo atinar, por mais que eu me esforce, como tamanha beleza
e genialidade puderam ser, um dia, pensadas por uma mente humana. O Temple
Expiatori de La Sagrada Familia é algo inumano à medida que é pedra e vidro e,
mesmo assim, tão poético e cheio de sentimentos que nos emociona profundamente.
Sinto-me impotente ao tentar
descrevê-la porque não há palavras que possam fazê-lo como se deveria. Talvez
gênios como Fernando Pessoa, Machado de Assis e outros escritores que também
nos parecem seres saídos de outro planeta, pudessem descrevê-la como se deve. Talvez.
Entretanto, não há, para mim,
vocabulário ou gramática o bastante para explicar a obra deste homem que me
alumbrou como nenhum outro fez. Pois esta é uma boa palavra para descrever a
obra do Senhor Gaudí: ele nos alumbra; iluminando corpo e alma com sua
arquitetura viva e feita de luz.
Há um contraste gigantesco entre
todas as facetas que temos desta igreja como se ela não fosse apenas uma. De longe
nos parece algo monumental e austero com seus tons de cinza, um castelo de
areia um tanto disforme, como me descreveu Gabriela. À distância, a Sagrada Família
nos assusta um pouco com um quê opressor que parece estar nela.
Contudo, basta aproximar-se de
sua soleira para entender que o que há nela é tudo, menos opressão. Neste momento,
depois de muito tempo viva, constatei que a pedra realmente fala. As estátuas
que vi falam; falam e se expressam com uma verborragia que nos impressiona
assim que levantamos os olhos em direção a elas. Homens e mulheres, o filho de
Deus entre eles, nos contam suas dores, suas mágoas, pesares e sofrimento na
fachada da Paixão de Cristo. Nela, Jesus é um homem, o vemos e sentimos como
homem e entendemos todo o peso e o pesar da cruz que ele carrega. A igreja é
algo vivo e que respira, feita de árvores, de frutos, de animais e de gente, e
por isso, deixam de ser feita, simplesmente, de pedra.
Passamos pela sua pesada porta
imaginando o que a de haver lá dentro: mais sofrimento, quiçá a penumbra,
santos em contrição. Então, invade-nos a luz. Uma luz suave que nos faz pensar
que estamos em outro lugar que não cá na Terra. E nos encantam os vitrais, as
colunas desproporcionais, o teto que parece respirar sobre nossas cabeças. Há santos
majestosos e vigilantes, mas poucos, e um Cristo tão humano flutuando sobre o
altar que nos dá vontade de subir até ali e retirá-lo da cruz para acabar com
sua dor. Vista por dentro, a Sagrada Família é a obra mais bonita e inspiradora
que eu já vi. Ela é algo descomunal.
Apesar de tudo, do princípio ao
fim, ser belo e expressivo, nada se compara à fachada da Natividade para mim. Não
sei dizer o porquê disso, não sei explicar. Entretanto, ela me tocou mais
profundamente que tudo ali. São apenas estátuas, imagens, figuras, mas elas
surpreendem fazendo do simples, do comum, do banal a mais divina e sagrada das experiências.
O nascimento de Jesus é delicado, belo e melancólico ao mesmo tempo. E eu, pela primeira vez, chorei por ver algo
feito de pedra e vidro, porque já não cabia mais em mim tamanha emoção.
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