terça-feira, 14 de dezembro de 2021
Tarde de Domingo
Tarde de Domingo
Saudade arde como um eco
e vejo que os braços do abraço são
Dela
numa tarde de domingo quente de quase verão
tudo ia muito bem
até que a minha curiosidade, sem pudores,
traiu-me o coração
Ou a razão?
Que razões me levam a tais sentimentos tão vis
Ciúmes
ciúmes agoniantes de ti
Fecho os olhos porque depois de tanto tempo aprendi
a fingir para mim mesma
que não me importa para quem andas a abrir a porta
Finjo
como finge todo e qualquer poeta
mesmo os mais pueris
que os sentimentos que andam por aqui não passam de muito barulho
sem sentido
Galhofa
Troça
Um escarnio do meu bem humorado coração que mimetiza
o sentir à perfeição
Não?
o inesquecível por sua cruel natureza
aflige-me a razão
saudades
quinta-feira, 9 de dezembro de 2021
Bola pro mato!
Bola pro mato!
Desde os tempos
em que Roma era o centro do universo, sabe-se que todos nós precisamos não
apenas de pão, mas de um tanto de circo para vivermos felizes e tranquilamente
ignorantes. Não que a ignorância seja uma benção, não o é. Contudo, poder
esquecer-se um pouco, por uma hora e tal, das desgraceiras da vida faz um bem
danado para corpo e alma. E eu, como todo ser pensante, adoro um bom espetáculo
para nublar a visão de vez em quando.
Hoje temos todos
os 20 times do campeonato brasileiro, o Brasileirão, a correr atrás da bola na
última rodada do campeonato para a alegria das caraminholas da minha cachola. Dois
jogos diante dos meus olhos, a acompanhar outros tantos de rabo de olho, eu
quero é ver o mundo hoje pegar fogo. (p.s. Grêmio faz 2 X 0 no Galo e, mesmo
assim, muito provavelmente amargará a Segundona em 22, ou quiçá teremos um
milagre por cá?).
Se o nosso
campeonato em Terra Brasilis está a léguas de distância da glamorosa e muy rica
Premiere League (e de quase todos os campeonatos europeus) no que tange à qualidade
da bola jogada, não fica nada atrás no que diz respeito à emoção (ok, ok, chega
a ser uma heresia tentar comparar os dois campeonatos; eu sei.). Mas eita
campeonato arretado esse nosso!
Hoje tem gente
que pode ganhar e cair, gente que pode apenas empatar e se salvar da degola,
gente que pode não ter jogado nada o ano todo e acabar na Libertadores da
América, gente que pode ter sido pequenino a vida toda, sem eira nem beira, a
chegar na tal Liberta pela primeira vez, oh glória! Hoje tem gente grande que
pode acabar cabisbaixo com o rabo entre as pernas. Hoje tem Timão. Hoje teremos
uma sacholada de gols. Hoje tudo acontece ao mesmo tempo agora. (Grêmio 3 X 0,
mas olha que o Bahia está a vencer. Vai Bahea!!!!
sexta-feira, 26 de novembro de 2021
quinta-feira, 25 de novembro de 2021
Quase
Quase
Quase dois anos de pandemia, de dias
blindados pela distância e de voz abafada por de trás de uma máscara. Nesses quase
dois anos, vivemos uma vida quase normal. Entretanto, o quase, no final de
todas as contas, significa que muito deixou de ser feito. Significa que pouco,
de fato, foi vivido para além dos feudos que criamos para nós mesmos. Acastelados
em nossas casas e apartamentos, nos escondemos e nos demos o direito a pouco. A
Pequenos grupos de amigos, a alguns membros da família, a parcos beijos e
abraços. Ao amor contido.
Deixamos de ver muitos, e muito. Não nos
demos a liberdade de simplesmente estar em qualquer lugar. Evitamos, com grande
incômodo para a alma, o contato com muitas gentes, com tantas gentes. E assim,
à força, forçados pelo medo e pela prudência, o quase chegou muito próximo ao
nada. Quase nada foi vivido verdadeiramente; sem limites ou medos.
Depois de tanto tempo, e tanto dizer
que nos mostra que muito não sabemos, a certeza que nos resta é não ter muita
certeza de como será a vida de agora para a frente. O futuro nunca foi tão
incerto para a grande maioria de nós. Para mim. Para mim, que tenho a
necessidade intrínseca de controlar minha vida à rédea curta, essa tal pandemia
chegou muito perto do caos; do fim dos tempos. De um repente, e sem a minha
permissão, o controle de minha vida, simplesmente, fugiu de mim.
Assim, depois de tudo, concluo que
quase, por estes tempos, é muito, é tudo, é nada.
quarta-feira, 24 de novembro de 2021
Eu canto samba / Quando bate uma saudade
Vem quando bate uma saudade
Triste, carregado de emoção
Ou aflito quando um beijo já não arde
No reverso inevitável da paixão
Quase sempre um coração amargurado
Pelo desprezo de alguém
É tocado pelas cordas de uma viola
É assim que um samba vem
Quando um poeta se encontra
Sozinho num canto qualquer do seu mundo
Vibram acordes, surgem imagens
Soam palavras, formam-se frases
Mágoas, tudo passa com o tempo
Lágrimas são as pedras preciosas da ilusão
Quando, surge a luz da criação no pensamento
Ele trata com ternura o sofrimento
E afasta a solidão
sexta-feira, 19 de novembro de 2021
A Censura Governamental no Brasil (Uma Ode à ignorância)
Questões
educacionais
MAFALDA É REPROVADA NO ENEM
De Laerte a Ferreira Gullar, de
Chico Buarque a Madonna – o que diziam as questões que o governo Bolsonaro
censurou em 2019 no Exame Nacional do Ensino Médio
Luigi Mazza in Revista Piauí
18 nov 2021_11h49
Mafalda, personagem de quadrinhos
criada pelo cartunista argentino Quino, é um sucesso conhecido no mundo inteiro
e traduzido em mais de 20 países. Em conversas com a mãe, com o pai e com os
amigos de escola, a menina expressa seu inconformismo diante do mundo. Numa
dessas tirinhas, publicada originalmente cinquenta anos atrás, Mafalda, prestes
a entrar para o jardim de infância, nota que sua mãe está apreensiva com a nova
fase na vida da filha. Por isso, Mafalda tenta tranquilizá-la: “Sabe, mamãe, eu
quero ir para o jardim de infância e estudar bastante. Assim, mais tarde não
vou ser uma mulher frustrada e medíocre como você!” A mãe fica desolada e
Mafalda sai andando, feliz. “É tão bom confortar a mãe da gente!”
Famoso, esse diálogo entre
Mafalda e sua mãe não agradou a uma comissão montada pelo governo Bolsonaro
para avaliar as questões que seriam aplicadas na versão 2019 do Enem, o Exame
Nacional do Ensino Médio. “Gera polêmica desnecessária”, concluiu a comissão,
ao justificar por que decidiu censurar a questão que trazia a personagem
argentina.
Naquele ano, atendendo aos
desejos do presidente Jair Bolsonaro, o então presidente do Inep, Marcus
Vinícius Rodrigues, montou uma equipe para analisar ideologicamente as questões
do exame. O grupo, composto por um procurador de Justiça, um diretor do Inep e
um ex-aluno de Ricardo Vélez Rodríguez, então ministro da Educação, se reuniu
ao longo de dez dias em março de 2019 e usou carimbos de “sim” e “não” para
aprovar ou rejeitar questões. Ao final dos trabalhos, eles excluíram 66
questões da prova, sem consultar a equipe técnica do Inep, que já havia
aprovado todos aqueles itens. Numa planilha de Excel, os censores apresentaram
justificativas sucintas – e mal explicadas – para suas escolhas.
Como a comissão só usou três
palavras, não fica claro o motivo de terem achado “polêmica” a tirinha de
Mafalda. É possível deduzir que ficaram incomodados com uma interpretação
feminista da história em quadrinhos. Também não se sabe mais detalhes da
questão. Nenhuma das perguntas foi divulgada. Isso porque elas não foram
deletadas do Banco Nacional de Itens; elas apenas não foram utilizadas na prova
daquele ano. No futuro, essas questões poderão aparecer no Enem, e, por isso,
precisam permanecer em sigilo.
A Piauí, no entanto, teve acesso
a um documento até hoje não divulgado em que servidores do Inep pediram a
reabilitação de parte das questões censuradas em 2019. Esse contraparecer,
ainda que não revele todo o conteúdo das perguntas, permite saber os assuntos
que incomodaram o governo, assim como as alegações usadas para retirá-los da
prova. Os servidores responsáveis pelo Enem pediram que 38 das 66 questões
fossem reabilitadas ou reconsideradas, e concordaram com a exclusão de 28
itens. O contraparecer até hoje não foi avaliado pela presidência do Inep. Com
isso, as questões censuradas, embora ainda pertençam ao banco de itens, estão
num limbo: não estão totalmente descartadas, mas também não podem ser
utilizadas até que haja uma nova decisão.
Os registros de 2019 talvez ajudem
a elucidar o que o presidente Jair Bolsonaro quis dizer, na última
segunda-feira (15), quando afirmou que o Enem deste ano terá “a cara do
governo”. A prova será aplicada nos próximos dois domingos, dias 21 e 28 de
novembro, em meio a uma crise sem precedentes no Inep, que levou 37 servidores
a entregarem seus cargos. Eles acusam o atual presidente do instituto, Danilo
Dupas, de assédio moral, de desrespeito às decisões técnicas dos servidores e
de interferência indevida no exame.
Assim como Mafalda, a cantora
Madonna foi censurada no Enem de 2019. Uma questão da área de linguagens usava
a letra da música Papa Don’t Preach para falar de gravidez na adolescência. Na
música, Madonna interpreta uma adolescente que confessa para seu pai que está
grávida. “Gera polêmica desnecessária”, disseram novamente os censores. Essa
foi a justificativa mais usada de todas: serviu para excluir 28 questões da
prova.
No contraparecer, os servidores
responsáveis pelo Enem pediram que a questão fosse reabilitada. Explicaram que
a música ajuda a explorar “as tensões associadas ao contexto” da gravidez
adolescente, e que a questão utiliza os conhecimentos de língua estrangeira
“como meio de ampliar as possibilidades de acesso a informações, tecnologias e
culturas”. Argumentaram em vão, já que até hoje a questão continua barrada no
banco de itens.
Outras seis questões foram
censuradas por fazerem referência à ditadura militar. Uma delas citava o poema
“Maio 1964”, escrito por Ferreira Gullar, que fala sobre a violência e as prisões
políticas ocorridas nas semanas seguintes ao golpe. “Mas quantos amigos presos!
/ quantos em cárceres escuros / onde a tarde fede a urina e terror”, diz uma
das estrofes. No gabarito desse item constava apenas que a poesia tratava do
“contexto em que o Brasil se encontrava após o golpe militar”. A comissão de
censura do Inep, ainda assim, decidiu excluir a questão do exame. A
justificativa? “Descontextualização histórica do texto.”
A suposta “descontextualização
histórica” também foi usada pelos censores para excluir uma pergunta que se
baseava num poema de Paulo Leminski e tratava da ditadura. Uma outra questão,
que citava uma letra de música escrita por Chico Buarque (não se sabe qual),
foi censurada com a seguinte explicação: “Leitura direcionada da história /
Sugere-se substituir ditadura por regime militar.” Os servidores pediram que a
exclusão fosse revista.
Em alguns casos, os servidores –
talvez sabendo que não poderiam comprar todas as brigas – aceitaram os
argumentos dos censores. Na questão que falava de Ferreira Gullar, eles
concordaram que o gabarito era inadequado porque, segundo eles, o poema revela
o “sentimento” de Gullar, “mas não necessariamente esse texto revela o contexto
brasileiro”. Também foi censurada uma questão sobre a prática de tortura pelos
militares. Ao consentir com a exclusão da pergunta, os servidores comentaram:
“Um instrumento que apresente itens que se refiram apenas a um lado da história
se mostraria inadequado e polêmico.”
Não foram poucas as charges
barradas na prova do Enem. Uma delas mostrava uma pessoa na igreja, se
confessando para um padre. “Padre, eu pequei”, diz o personagem. O padre,
sentado em frente ao computador, acessando o Facebook, responde: “Eu já sabia…”
A religião não era o assunto central da questão. Na avaliação pedagógica feita
pelos servidores, o item “provoca o estudante a analisar criticamente e lançar mão
de outros recursos linguísticos”. Ainda assim, a comissão de censura excluiu a
questão, dizendo que ela “fere o sentimento religioso”.
Charge censurada no Enem em 2019
— Crédito: Reprodução/Autor desconhecido
A mesma justificativa foi usada
para censurar uma poesia de Manoel de Barros, usada em uma das questões. A
partir da descrição feita pelos servidores, pode-se deduzir que se tratava do
poema VII, de O Livro das Ignorãças, em que Barros faz alusão à Bíblia: “No
descomeço era o verbo”, diz o primeiro verso do poema, numa referência ao
Gênesis. Diante dessa heresia, os censores excluíram a questão e justificaram:
“Fere sentimento religioso e a liberdade de crença.”
A comissão de censura do Inep
usou a palavra liberdade para proteger sentimentos religiosos. Mas ignorou-a ao
excluir da prova de ciências humanas uma charge da cartunista Laerte que,
segundo o registro dos servidores, propunha uma “reflexão crítica sobre o
reconhecimento à diversidade na sociedade contemporânea”. Ao censurar a charge,
a comissão fez o seguinte comentário: “Leitura direcionada da história /
Direcionamento do pensamento.” Ao excluir uma outra questão, dessa vez na prova
de matemática, os censores do Inep foram além: disseram que o item “gera
polêmica desnecessária em relação à ideia de casal”.
Não faltam exemplos exóticos. Uma
outra questão, dessa vez na prova de ciências da natureza, falava sobre os
cuidados com relação ao vírus HIV e afirmava que o uso de camisinha é “o meio
de prevenção mais barato e eficaz” contra a Aids. “Gera polêmica desnecessária
/ Direcionamento do controle de saúde”, assinalou a comissão de censura do
Inep. Na mesma toada, foi excluída uma questão que falava sobre a proliferação
de doenças. O item explicava que a hanseníase tende a se espalhar com
facilidade em presídios no Brasil, devido à superlotação e às condições
precárias em que vivem os presos. “Gera polêmica desnecessária em relação ao
sistema penal”, disse a comissão.
Nem mesmo uma questão sobre
agricultura escapou à caneta dos censores. Ao se deparar com uma charge sobre a
produção de milhos transgênicos, os bolsonaristas não titubearam: “Gera
polêmica desnecessária em relação à produção no campo.” A questão foi excluída.
A comissão de censores foi fiel
ao pensamento de Bolsonaro. Questões sobre escravidão, violência policial ou
movimentos sociais foram parar na gaveta em 2019. Três questões que falavam de
“conflitos sociais” foram excluídas do Enem com a alegação de que faziam
“leitura direcionada da história” (essa justificativa foi usada para censurar
19 itens). Um item que falava sobre a abolição da escravatura e a “persistência
das condições precárias dos pobres negros no Brasil” foi excluída da prova
porque, segundo a comissão, houve uma “descontextualização histórica do texto”.
Uma outra questão que falava sobre segurança pública mencionava, em uma das
alternativas de resposta, a violência da polícia na Bahia. Por isso, também foi
censurada. “Ofensivo à força policial baiana”, explicou o trio de censores.
Discutir feminismo foi proibido
na prova. Uma questão de ciências humanas que falava sobre a Marcha das Vadias,
mostrando uma foto de mulheres de sutiã durante uma manifestação do grupo, foi
barrada por gerar “polêmica desnecessária”. Outra questão que debatia a
maioridade penal foi excluída do exame. “Gera polêmica desnecessária a favor da
não redução da maioridade penal”, escreveu a comissão de censura, alinhada com
o pensamento do presidente. Naquele ano, Bolsonaro pressionava o Senado para
aprovar um projeto que reduzisse a maioridade penal para crimes hediondos, uma
velha bandeira de campanha.
Também houve cuidado com os
assuntos de política externa. Uma questão da área de ciências humanas que
falava sobre as relações entre o governo Donald Trump e Israel foi cortada do
exame. A justificativa da comissão de censura foi a seguinte: “Leitura
direcionada da história / Interferência desnecessária na soberania de outro
país.” Já uma pergunta que falava sobre a Liga das Nações e a “implantação da
sociedade judaica na Palestina do início do século XX” – tema relevante para
uma prova de ciências humanas – foi excluída porque, segundo a comissão, fazia
“leitura direcionada de geografia / história”.
Os censores fizeram questão de
mostrar sua preocupação com a juventude. Excluíram da prova uma questão de
ciências da natureza que versava sobre o canibalismo entre animais. “Induz o
jovem a comportamento antissocial”, justificou a comissão de censura do Inep.
O governo também garantiu que não
se falasse sobre armas de fogo no Enem. Na área de linguagens, um texto falava
sobre uma tragédia ocorrida em 2013, na cidade de Burkesville, nos Estados
Unidos: um menino de 5 anos disparou acidentalmente um fuzil que havia ganhado
de presente e matou sua irmã mais nova dentro de casa. O objetivo do item,
segundo os servidores, era discutir o risco existente “em ambientes domésticos
em que há a possibilidade de acesso à arma por crianças”. Mas a comissão de
censura do Inep não achou que o tema deveria ser apresentado aos 5,1 milhões de
alunos que se inscreveram no Enem em 2019. A questão foi banida da prova sob a
alegação quase onipresente nas justificativas dos censores: “polêmica
desnecessária.”
segunda-feira, 15 de novembro de 2021
Perder-se
Perder-se
Ai de mim, agora sim
Agora não
Então, de ti me perdi por fim
Que fim! Me perdi de ti e não sei voltar
Não sei o caminho da tua casa e por onde seus passos estão
Não sei o que digo
E nem se faz qualquer sentido dizer algo aqui
Penso que não
Sinto que sim
Porque o sentir continua crente como antes, apenas que agora
Sem luz nem água; minguou
E ele anda calado, sem desejo para o falar;
Cabisbaixo
Contudo, de voz baixinha, um tanto rouca, às vezes o sentir
Te diz:
Amor...
Te Perdi em mim assim
perder-se
No fim.
Las cartas de amor
Las cartas
de amor
Ellos
se conocieron por casualidad, que es como se suelen encontrar los grandes
amores, casi siempre por casualidad, por una llamada equivocada, por un
encuentro fortuito. A ellos lo que les pasó fue que él había quedado en aquel
café con una persona que no vino, y claro, la vio a ella sentada en la mesa del
café, radiante, así que, harto de esperar no se cortó un pelo y dijo:
—“ya
que he venido hasta aquí, no puedo desaprovechar esta ocasión”.
Se
acercó a la mesa y dijo:
—“¿Me
permite?”
—“Por
supuesto”
Esto
solo suele pasar en las historias que te cuentan otros, nunca en la vida real,
por lo general cuando dices:
—“Me
permites”, dicen
—“De
qué”
A lo
mejor ella estaba esperando a alguien que tampoco vino, quién sabe, yo qué sé,
habrá que inventar otra historia en la que ella le dice “De qué”, en este caso
ella lo invitó a él para que se sentase, y él se sentó. Y claro, no había de
qué hablar,
—“¿y
qué lees?”
Lo malo
fue que él no había leído nada del escritor que ella estaba leyendo, mal
empezamos, mal, muy mal, por ahí no.
—“Pues
bonito día”
Pero
enseguida empezaron a profundizar, porque ella dijo
—“Sí,
la verdad es que hace un bonito día”
Y
aunque no lo hiciera. Pero poco a poco él fue venciendo esa timidez que le
caracteriza y fueron profundizando. Al principio él para llamar su atención
contó una que otra mentira, que era escritor, luego reconoció que nunca le
habían publicado nada, pero eso vino más tarde, cuando ya se conocían más,
cuando pasaron del café a la habana con coca cola.
Por
entonces ya estaban descubriendo que tenían más afinidades de las que pensaban
al principio, y compartían gustos cinematográficos, y por eso él le dijo
—“Oye,
y si vamos a ver esta, ¿has visto La vida es bella?” y ella
—“No”,
—“Oye
quedamos el fin de semana”,
—“Vale”.
Y aquel
fin de semana pues, yo no sé muy bien si para sorprenderla o no, pero el caso
es que él rompía a llorar en cada escena en la que aparecía el chaval pequeño,
esto a ella le enterneció, yo quiero pensar que era de verdad.
Resulta
que coincidían en más gustos, y también en lo musical, y le dijo:
—“Oye,
este fin de semana toca Ismael Serrano”,
—“Ismael
qué?”,
—“Pero
a ti te gustan los cantautores?”,
—“Los
de verdad me gustan”.
Pero él
le convenció a ella y fueron. Cuando él empezó a cantar aquella de Vértigo,
pues se atrevió a cogerle la mano.
Y poco
a poco se fueron inevitablemente enamorando, pero no por esto de Ismael
Serrano, ni por el Vértigo, quizá más por aquello de llorar con La vida es
bella.
Una
mañana él se levanta y al abrir los ojos se da cuenta de que está perdidamente
enamorado de ella, y quedaron entonces en aquel café en el que se conocieron
por casualidad. Los momentos importantes suelen coincidir casi siempre en los
mismos sitios, no estoy muy seguro de lo que acabo de decir, pero es una buena
frase. Pero fue en aquel café en donde ella le dijo:
—“Sabes,
creo que me tengo que ir durante algún tiempo”,
—“Yo te
iba a decir casi lo contrario, que te quedaras conmigo para toda la vida”, y
ella dijo –“No te preocupes porque yo estaré esperando el día que vuelva para
retomar contigo este camino que emprendimos, además, cada quince días
puntualmente te mandaré una carta en la que te contaré todo lo que hecho, todo
lo que siento, todo lo mucho que te echo de menos, y todo lo poco que nos falta
para vernos”,
El dijo
que bueno, que vale
—“Pero
que si no te vas casi mejor”.
Pero se
fue.
Fue
entonces cuando descubrió que aquello no tenía remedio y que estaba
perdidamente enamorado, que no había ningún elixir que hiciera que la olvidase,
que no era cierto aquella de que un clavo saca otro clavo, que a veces es
cierto que los amores a primera vista existen, bueno, ¿es que acaso hay otros?.
A los
quince días puntualmente llegó la carta de ella toda llena de besos y de
caricias, de te echo de menos, él lloró, y esta vez era de verdad. Y guardaba
las cartas con mucho cariño encima de la mesilla. Pasaron quince días, y otros
quince, y otros quince, y otros quince, y las cartas se iban acumulando. Y su
vida consistía en esperar a que llegara el decimoquinto día, abrir el buzón y
encontrar la carta de amor en la que ella prometía volver, esperar esa carta en
la que ella le diría que volvía pronto. Y pasaron años, muchos años, y ya las
cartas casi no cabían en la casa, se compró una gran caja fuerte para guardar
todas las cartas, porque eran su gran tesoro, porque vivía para leer las cartas
que ella le había escrito, porque ella era lo que más quería, y así pasaron
creo que diez años, quince, no me acuerdo.
Y un
día ella, sin saber cómo ni por qué, dejó de escribir, y al quince día él se
encontró el buzón vacío, y el alma partida en dos.
Ahora
solo podía vivir del recuerdo, leyendo las cartas que ella le había escrito con
tanto cariño, aquellas cartas eran su mayor tesoro.
Un día
él salió de casa, porque tenía que salir, y unos ladrones entraron en su casa.
Al ver allí la gran caja fuerte no se lo pensaron dos veces, porque pensaron
que debían esconder algún gran tesoro, grandes riquezas, realmente no era. Y se
llevaron la gran caja fuerte.
Imagínate
la desolación de nuestro protagonista cuando llega a su casa y se da cuenta de
que le han robado lo que él más quería, lo que le hacía sentirse vivo algunas
tardes de domingo cuando no sonaba el jodido teléfono, cuando releía aquellas
cartas y aquellas promesas quién sabe si falsas.
Suele
pasar que los ladrones son buenas personas, y este era el caso. Pero imagínate
la cara de los ladrones cuando abren la caja fuerte y se encuentran montones de
cartas de amor, declaraciones imposibles. El jefe de los ladrones se enfadó un
poquito, pues la caja pesaba, y llevarla a la guarida no era moco de pavo.
Nuestro
hombre vagaba casi moribundo por las calles de su ciudad, con la esperanza de
encontrar alguna carta, a alguien que le hablara de una gran caja fuerte llena
de cartas, perdido sin saber ya qué hacer.
El jefe
ladrón lo que dijo es que aquellas cartas lo que había que hacer era quemarlas
o tirarlas al río, lo que fuera, pero que desaparecieran de inmediato. Pero el
más joven de los ladrones era más bueno, y se le ocurrió una gran idea.
Un día
nuestro hombre llegó a casa después de estar buscando toda una tarde, y al
abrir el buzón ¿Adivina lo que se encontró?... Una carta. Los ladrones habían
decidido mandarle las cartas tal y como ella se las había mandado, puntualmente
cada quince días, por riguroso orden.
Ahora
él resucitaba con la esperanza de revivir aquellos momentos en los que quizá un
día leería la carta en la que ella diría:
—“Pronto
estaré allí”.
por Eduardo Galeano
domingo, 7 de novembro de 2021
Em branco
Em branco
João abriu a
porta para um inconcebível corredor branco sem fim; sem janelas, sem portas,
sem ruídos. Apenas o insípido e tão hermético branco.
Ele acordara
zonzo, sem saber bem onde e quando estava. A respiração era pesada com o coração
a bater reticentemente, e João sentia-se confuso enquanto sua mente corria em
todas as possíveis direções tentando entender a realidade.
Segundos longuíssimos...
Que dia era
aquele? Domingo? Estou sozinho aqui? Onde é mesmo aqui? Morri? Não morri,
pensou ele. Não me sinto morto. Como é sentir-se morto? Muito diferente de
estar vivo? Eu estava vivo? Quando? Quanto?
João fechou a
porta azul clara para proteger-se da brancura infinita daquele mundo inócuo e
assustador. No quarto havia alguma cor. Uma cama macia, mesa e cadeira de
madeira, uma jarra d’água quase vazia, uma planta calada; muito seca. A um
canto uma grande estante cheia de livros e discos. Ao lado um toca-discos
antigo. Pela janela de vidro via-se o mar ao longe.
Não moro mais
perto do mar. Lembrou-se o homem enquanto olhava pela janela. Não havia vivalma
pelas ruas pelo que ele percebia. O mundo estava lindo, iluminado, morno e
vazio. O mundo e o corredor não tinham som. Será que estou surdo? Pensou João. Não.
Não pode ser. Por que ele estaria surdo de um repente?
Escolheu um
disco aleatoriamente. Um disco de Cartola... Em alguns segundos “Peito Vazio”
ecoava pelo quarto de João. O mundo estava em silêncio apenas para ouvir ao
Cartola; pensou ele. E um sorriso suave fez-se no rosto dele. Esta realidade
não está tão má assim. Finalmente faz-se jus a um gênio tão pouco compreendido.
Seu Agenor merecia tal reverência.
João passou a
chave na porta sem coragem para abri-la novamente. Escolheu um bom livro e,
como se nada mais importasse, deitou-se confortavelmente na cama para ler
aproveitando a luz do dia que entrava tranquila pela janela.
O mundo deixou
de existir.
segunda-feira, 25 de outubro de 2021
quarta-feira, 20 de outubro de 2021
Clariceando
Alma luz
Minha alma tem o peso da luz
Tem o peso da música
Tem o peso da palavra nunca dita,
Prestes quem sabe a ser dita
Tem o peso de uma lembrança
Tem o peso de uma saudade
Tem o peso de um olhar
Pesa como pesa uma ausência
E a lágrima que não chorou
Tem o imaterial peso de uma solidão
No meio de outros
A lucidez perigosa
Estou sentindo uma clareza tão grande
que me anula como pessoa atual e comum:
é uma lucidez vazia, como explicar?
assim como um cálculo matemático perfeito
do qual, no entanto, não se precise. Estou por assim dizer
vendo claramente o vazio.
E nem entendo aquilo que entendo:
pois estou infinitamente maior que eu mesma,
e não me alcanço.
Além do que:
que faço dessa lucidez?
Sei também que esta minha lucidez
pode-se tornar o inferno humano
– já me aconteceu antes. Pois sei que
– em termos de nossa diária
e permanente acomodação
resignada à irrealidade –
essa clareza de realidade
é um risco. Apagai, pois, minha flama, Deus,
porque ela não me serve
para viver os dias.
Ajudai-me a de novo consistir
dos modos possíveis.
Eu consisto,
eu consisto,
amém.
Dá-me a tua mão
Dá-me a tua mão:
Vou agora te contar
como entrei no inexpressivo
que sempre foi a minha busca cega e secreta.
De como entrei
naquilo que existe entre o número um e o número dois,
de como vi a linha de mistério e fogo,
e que é linha sub-reptícia.
Entre duas notas de música existe uma nota,
entre dois fatos existe um fato,
entre dois grãos de areia por mais juntos que estejam
existe um intervalo de espaço,
existe um sentir que é entre o sentir
– nos interstícios da matéria primordial
está a linha de mistério e fogo
que é a respiração do mundo,
Clarice Lispector
domingo, 17 de outubro de 2021
Seguimos
Seguimos
À mingua sem cama sem língua
Nem uma ínfima gota da tua saliva
Solo seco
Seco eu a solo
Nesta vida sem inventos
Sigo
Tu segues
Cegos ambos à fantasia de uma vida de flores,
borboletas e andorinhas
Este inesperado encontro para além do conjunto espaço-tempo que
nos continha
Foi um grande susto
Justo
Injusto, como saber o que fazer quando nada se sabia?
Não soubemos
Seguimos, não conseguimos seguir a acreditar que a vida é
muito mais do que
aquilo que se pode explicar
ficas tu
e assim fico
à mingua, sem o colo das palavras faladas, cantadas e
encantadas
que me faziam acreditar
que o amor não é apenas uma tola mentira
que nos agrada contar.
terça-feira, 12 de outubro de 2021
Poema Enjoadinho (aos meus miúdos de coração)
Filhos... Filhos?
Melhor não tê-los!
Mas se não os temos
Como sabê-los?
Se não os temos
Que de consulta
Quanto silêncio
Como os queremos!
Banho de mar
Diz que é um porrete...
Cônjuge voa
Transpõe o espaço
Engole água
Fica salgada
Se iodifica
Depois, que boa
Que morenaço
Que a esposa fica!
Resultado: filho.
E então começa
A aporrinhação:
Cocô está branco
Cocô está preto
Bebe amoníaco
Comeu botão.
Filhos? Filhos
Melhor não tê-los
Noites de insônia
Cãs prematuras
Prantos convulsos
Meu Deus, salvai-o!
Filhos são o demo
Melhor não tê-los...
Mas se não os temos
Como
sabê-los?
Como
saber
Que
macieza
Nos seus cabelos
Que cheiro morno
Na sua carne
Que gosto doce
Na sua boca!
Chupam gilete
Bebem xampu
Ateiam fogo
No quarteirão
Porém, que coisa
Que coisa louca
Que coisa linda
Que os filhos são!
Ao tempo
Ao tempo
Devora-me, tempo
Pele, ossos e nervos
Levando cotidianamente um pouco de mim
Eu, que me deixo levar de bom grado
Sem medos,
Sem termos,
De braços dados a si
Caminho,
Construo com suas entranhas meu mundo enquanto
Devora-me,
e de si alimento-me engordando pensamentos
ganhando peso na terra
ganhando cores meus sonhos
Estamos ambos a caminho do fim, sem pressa, a ouvir as águas
deste riacho de pedrinhas coloridas,
um tanto preguiçoso,
muito claro.
Seguir.
segunda-feira, 4 de outubro de 2021
terça-feira, 28 de setembro de 2021
A Vida
A Vida
Passaram-se
muitos anos como se fossem poucos, como se fossem um par de dias. E o tempo
passado importa tão pouco para as horas que agora se arrastam. Relativo é o
tempo, e desimportante a vida dos homens sobre a terra, tanto quanto miúda é a
minha. Enfileiro as letras e as palavras como Chronos enfileira horas e dias,
displicentemente. Não sei se em prosa ou poesia, escrevo as ideias perdidas
pela cachola que aqui encontram-se para comentar esta minha vidinha simples,
simplesmente minha.
Depois de tanto
tempo, todo o tempo que já tenho guardado nos bolsos das calças, sei que pouco
importa o que cada um de nós faz para além do nosso quintal porque a vida que
levamos é nossa, apenas nossa, e daqueles que guardamos no meio dos abraços colados
ao peito. E quase nada me importa o que as pessoas fazem para além deste meu
quintal onde cultivo flores, letras, abelhas, a luz do sol, passarinhos sem
gaiolas e meus amores novos e antigos. Que me importa o que pensam as pessoas
importantes desse mundo? Uma titica de galinha, diria minha avó. Digo eu.
Quanto tempo
tenho eu? Não sei; isso nunca se sabe. Apenas sei como quero usar o tempo que
ainda tenho. Rir é uma prioridade, ensinar um prazer, beber vinho, água, cerveja
e café vícios que levarei para sempre comigo, chocolate e sorvete são e serão uma
necessidade. A família de sangue e a da vida quero sempre levar comigo pois
neles tenho todo o conforto e o abrigo que necessito, viajar faz falta como nos
falta o ar com a máscara no rosto; ver o mundo areja a alma. A velhice
aproxima-se desavergonhadamente, contudo, já não tenho mais medo dela como
tinha antigamente. E isso é muito bom. Bora viver com gosto com os olhos e o
nariz mirando para frente!
Agora
José
E agora, José?
A festa acabou,
a luz apagou,
o povo sumiu,
a noite esfriou,
e agora, José?
e agora, você?
você que é sem nome,
que zomba dos outros,
você que faz versos,
que ama, protesta?
e agora, José?
Está sem mulher,
está sem discurso,
está sem carinho,
já não pode beber,
já não pode fumar,
cuspir já não pode,
a noite esfriou,
o dia não veio,
o bonde não veio,
o riso não veio,
não veio a utopia
e tudo acabou
e tudo fugiu
e tudo mofou,
e agora, José?
E agora, José?
Sua doce palavra,
seu instante de febre,
sua gula e jejum,
sua biblioteca,
sua lavra de ouro,
seu terno de vidro,
sua incoerência,
seu ódio — e agora?
Com a chave na mão
quer abrir a porta,
não existe porta;
quer morrer no mar,
mas o mar secou;
quer ir para Minas,
Minas não há mais.
José, e agora?
Se você gritasse,
se você gemesse,
se você tocasse
a valsa vienense,
se você dormisse,
se você cansasse,
se você morresse...
Mas você não morre,
você é duro, José!
Sozinho no escuro
qual bicho-do-mato,
sem teogonia,
sem parede nua
para se encostar,
sem cavalo preto
que fuja a galope,
você marcha, José!
José, para onde?
Carlos Drummond de Andrade. Meu Carlos, e agora? Não demora...
sexta-feira, 24 de setembro de 2021
terça-feira, 21 de setembro de 2021
Encanto
Encanto
Encanto, meu encanto
Espanto sem pranto
Teu pranto, meu pranto
Recanto
Canto
(Re)encanto
Recato
Ato
Meu encanto, desencanto
Teu encanto
Tanto
E damos outra volta na ciranda dos nossos encantos tamanhos
Me encanta, Eu te canto
Meu amor
domingo, 19 de setembro de 2021
A poesia paulistana
A poesia paulistana
Pela segunda vez vejo o pintor holandês a caminhar no
meio-fio
Ele segue de pé, perdido,
objetos indistintos nas mãos e o olhar infinito
Assim olhou-me Van Gogh com seus olhos claros vidrados
rosto vincado e barba cor de girassóis
O vejo
Como vejo, com o passar dos dias, a multiplicação
de casas pelos gramados nos canteiros na minha cidade
casas de lona
casas de papel
casas que não têm teto e que não tem nada
casas que em nada são engraçadas
Uma senhora magra varre, todos os dias, um pedaço de terra
e eu a observo enquanto aguardo o semáforo abrir
Indiscreta
pela janela do carro, sem pedir licença, invado a sala de estar dela
O que ela chama de seu nessa vida me assombra
me assombra pela minha covarde apatia cotidiana e coletiva
Numa destas casas um balanço pequeno feito de delicadezas
faz o meu coração apertar e sorrir ao mesmo tempo
Vida agridoce essa do brasileiro
vida pequenina
Van Gogh, na São Paulo poética e suja que eu chamo de minha,
caminha sem destino
sozinho
sábado, 11 de setembro de 2021
REI DA MAMATA
Dizem por aí que eu sou o rei da mamata
Caçador de patrocínios, comunista, esquerdopata
Dizem também que de arte ninguém mais precisa
Quando o mundo acabar por favor alguém me avisa
Dizem que eu mamo nas tetinhas da cultura
Quando o artista canta, o idiota nem murmura
Bando de hipócritas lambendo a sandália
De gente rica, inculta, ignorante, uma gentalha
Eu podia estar roubando
Eu podia estar matando
Eu podia ser o líder da milícia na chacina
Eu podia estar ganhando até um dólar por vacina
Mas eu sigo trabalhando
E compondo e cantando
Ajudando a erguer uma nação desta latrina
A cumprir mui sinceramente a minha sina
Você por sua vez se orgulhando da bravata
De ser apoiador de um imbecil sociopata
Requenguela, mequetrefe
Cada qual tem a cultura que merece
Ordinário, mequetrefe
Cada um tem a cultura que merece
sexta-feira, 3 de setembro de 2021
Faroeste Caboclo
Não tinha medo o tal João de Santo Cristo
Era o que todos diziam quando ele se perdeu
Deixou pra trás todo o marasmo da fazenda
Só pra sentir no seu sangue o ódio que Jesus lhe deu
Quando criança só pensava em ser bandido
Ainda mais quando com um tiro de soldado o pai morreu
Era o terror da sertania onde morava
E na escola até o professor com ele aprendeu
Ia pra igreja só pra roubar o dinheiro
Que as velhinhas colocavam na caixinha do altar
Sentia mesmo que era mesmo diferente
Sentia que aquilo ali não era o seu lugar
Ele queria sair para ver o mar
E as coisas que ele via na televisão
Juntou dinheiro para poder viajar
De escolha própria, escolheu a solidão
Comia todas as menininhas da cidade
De tanto brincar de médico, aos doze era professor
Aos quinze, foi mandado pro o reformatório
Onde aumentou seu ódio diante de tanto terror
Não entendia como a vida funcionava
Discriminação por causa da sua classe e sua cor
Ficou cansado de tentar achar resposta
E comprou uma passagem, foi direto a Salvador
E lá chegando foi tomar um cafezinho
E encontrou um boiadeiro com quem foi falar
E o boiadeiro tinha uma passagem e ia perder a viagem
Mas João foi lhe salvar
Dizia ele "estou indo pra Brasília
Neste país lugar melhor não há
'Tô precisando visitar a minha filha
Eu fico aqui e você vai no meu lugar"
E João aceitou sua proposta
E num ônibus entrou no Planalto Central
Ele ficou bestificado com a cidade
Saindo da rodoviária, viu as luzes de Natal
Meu Deus, mas que cidade linda
No Ano Novo eu começo a trabalhar
Cortar madeira, aprendiz de carpinteiro
Ganhava cem mil por mês em Taguatinga
Na sexta-feira ia pra zona da cidade
Gastar todo o seu dinheiro de rapaz trabalhador
E conhecia muita gente interessante
Até um neto bastardo do seu bisavô
Um peruano que vivia na Bolívia
E muitas coisas trazia de lá
Seu nome era Pablo e ele dizia
Que um negócio ele ia começar
E o Santo Cristo até a morte trabalhava
Mas o dinheiro não dava pra ele se alimentar
E ouvia às sete horas o noticiário
Que sempre dizia que o seu ministro ia ajudar
Mas ele não queria mais conversa
E decidiu que, como Pablo, ele ia se virar
Elaborou mais uma vez seu plano santo
E sem ser crucificado, a plantação foi começar
Logo logo os maluco da cidade souberam da novidade
"Tem bagulho bom ai!"
E João de Santo Cristo ficou rico
E acabou com todos os traficantes dali
Fez amigos, frequentava a Asa Norte
E ia pra festa de rock, pra se libertar
Mas de repente Sob uma má influência dos boyzinho da cidade
Começou a roubar
Já no primeiro roubo ele dançou
E pro inferno ele foi pela primeira vez
Violência e estupro do seu corpo
Vocês vão ver, eu vou pegar vocês
Agora o Santo Cristo era bandido
Destemido e temido no Distrito Federal
Não tinha nenhum medo de polícia
Capitão ou traficante, playboy ou general
Foi quando conheceu uma menina
E de todos os seus pecados ele se arrependeu
Maria Lúcia era uma menina linda
E o coração dele pra ela o Santo Cristo prometeu
Ele dizia que queria se casar
E carpinteiro ele voltou a ser
Maria Lúcia pra sempre vou te amar
E um filho com você eu quero ter
O tempo passa e um dia vem na porta
Um senhor de alta classe com dinheiro na mão
E ele faz uma proposta indecorosa
E diz que espera uma resposta, uma resposta do João
Não boto bomba em banca de jornal
Nem em colégio de criança isso eu não faço não
E não protejo general de dez estrelas
Que fica atrás da mesa com o cu na mão
E é melhor senhor sair da minha casa
Nunca brinque com um Peixes de ascendente Escorpião"
Mas antes de sair, com ódio no olhar, o velho disse
"Você perdeu sua vida, meu irmão"
"Você perdeu a sua vida meu irmão
Você perdeu a sua vida meu irmão
Essas palavras vão entrar no coração
Eu vou sofrer as consequências como um cão"
Não é que o Santo Cristo estava certo
Seu futuro era incerto e ele não foi trabalhar
Se embebedou e no meio da bebedeira
Descobriu que tinha outro trabalhando em seu lugar
Falou com Pablo que queria um parceiro
E também tinha dinheiro e queria se armar
Pablo trazia o contrabando da Bolívia
E Santo Cristo revendia em Planaltina
Mas acontece que um tal de Jeremias
Traficante de renome, apareceu por lá
Ficou sabendo dos planos de Santo Cristo
E decidiu que, com João ele ia acabar
Mas Pablo trouxe uma Winchester-22
E Santo Cristo já sabia atirar
E decidiu usar a arma só depois
Que Jeremias começasse a brigar
Jeremias, maconheiro sem-vergonha
Organizou a Rockonha e fez todo mundo dançar
Desvirginava mocinhas inocentes
Se dizia que era crente mas não sabia rezar
E Santo Cristo há muito não ia pra casa
E a saudade começou a apertar
Eu vou me embora, eu vou ver Maria Lúcia
Já 'tá em tempo de a gente se casar
Chegando em casa então ele chorou
E pro inferno ele foi pela segunda vez
Com Maria Lúcia Jeremias se casou
E um filho nela ele fez
Santo Cristo era só ódio por dentro
E então o Jeremias pra um duelo ele chamou
Amanhã às duas horas na Ceilândia
Em frente ao Lote 14, é pra lá que eu vou
E você pode escolher as suas armas
Que eu acabo mesmo com você, seu porco traidor
E mato também Maria Lúcia
Aquela menina bosal pra quem jurei o meu amor
E o Santo Cristo não sabia o que fazer
Quando viu o repórter da televisão
Que deu notícia do duelo na TV
Dizendo a hora e o local e a razão
No sábado então, às duas horas
Todo o povo sem demora foi lá só para assistir
Um homem que atirava pelas costas
E acertou o Santo Cristo, começou a sorrir
Sentindo o sangue na garganta
João olhou pras bandeirinhas e pro povo a aplaudir
E olhou pro sorveteiro e pras câmeras e
A gente da TV que filmava tudo ali
E se lembrou de quando era uma criança
E de tudo o que vivera até ali
E decidiu entrar de vez naquela dança
Se a via-crucis virou circo, estou aqui
E nisso o sol cegou seus olhos
E então Maria Lúcia ele reconheceu
Ela trazia a Winchester-22
A arma que seu primo Pablo lhe deu
Jeremias, eu sou homem. coisa que você não é
E não atiro pelas costas não
Olha pra cá filha da puta, sem-vergonha
Dá uma olhada no meu sangue e vem sentir o teu perdão
E Santo Cristo com a Winchester-22
Deu cinco tiros no bandido traidor
Maria Lúcia se arrependeu depois
E morreu junto com João, seu protetor
E o povo declarava que João de Santo Cristo
Era santo porque sabia morrer
E a alta burguesia da cidade
Não acreditou na história que eles viram na TV
E João não conseguiu o que queria
Quando veio pra Brasília, com o diabo ter
Ele queria era falar pro presidente
Pra ajudar toda essa gente que só faz
Sofrer
quarta-feira, 1 de setembro de 2021
Blahhhhhhh
Blahhhhhhh
Já quisemos
tanto. Quisemos mudar o mundo, revolucionar os costumes, sermos melhores do que
foram os nossos pais. E, como todo ser humano que já pisou neste planeta, nos pensávamos
eternos; “forever young, I want to be forever young...” cantei tantas vezes. Bem,
não somos muito diferentes dos nosso pais. Não fomos. Somos apenas um pouco
mais do mesmo, quiçá, com um toque tech a mais. Nada mais. Talvez piores,
materialistas rasos sem grandes paixões. Seres profundamente egoístas com
dinheiro no banco enquanto tantos morrem de fome.
Temos mais
dinheiro do que nossos pais, ok. E daí?
Pois 1 que a tal
revolução não fizemos, não senhor. E hoje, bem mais preguiçosos e cansados do
que aos 20, queremos apenas sossego; quem diria. Verdade seja dita, houve
mudanças. Contudo, eu que aos 15 preocupava-me com a situação das baleias e com
a volta da democracia e da igualdade no meu país, sinto-me desolada. Desapontada
comigo mesma e com os meus pares. Falhamos. Eu esperava muito mais de nossa
geração.
Esperava tanto mais
do mundo e do meu país. Acreditava que cuidaríamos bem da natureza, que à esta
altura compreenderíamos melhor e mais sinceramente as diferenças entre as
pessoas e os povos, achava que caminhávamos para um mundo onde a abundância
seria melhor compartilhada. Pois 2, eu era jovem e tola. Muito tola.
Costumo dizer
que Lula, o senhor Luiz Inácio da Silva, em seu primeiro mandato, foi o último
a fazer-me de palhaça nesta terra. Nunca me esquecerei da cara lavada dele em
pronunciamento na TV a dizer que nada sabia sobre a corrupção e os desvios em
seu governo. Palhaço... palhaçada, pensei. Raposa covarde! E me perguntava se
alguém poderia crer numa farsa tão absurda como aquela.
Pois 3, muitos
acreditaram. Muitos ainda creem na inocência desse senhor que de inocente não
tem absolutamente nada. Entretanto, e infelizmente, a crença na inocência do
seu Inácio não vem a ser o fato mais absurdo e nocivo em Terra Brasilis. Não.
Não há, e muito
provavelmente não haverá jamais, um absurdo maior e um dano mais grave do que
termos eleito o seu Jair como presidente do nosso país. Difícil entender como
pudemos, e ainda podemos, crer que um calhorda como esse senhor pudesse fazer
algo de bom a alguém. Não pode.
Nada de bom pôde
ou poderá sair da mente turva e egoísta do Sr. Bolsonaro e de sua quadrilha
familiar. Já que são um bando de calhordas de longa tradição na canalhice.
Pois 4, apesar
de saber que seu Inácio e seu partido também flertaram acintosamente com o
desejo de ter todo o poder possível em suas mãos, nunca estivemos tão próximos
de um retorno de um governo ditatorial como agora. Nunca vimos uma demonstração
tão clara de um governante que não consegue pensar o mundo para além de seu
umbigo. Seu Jair quer perpetuar seu poder no Brasil e para tal arma-se.
Arma-se com
parte do exército brasileiro, com boa parte da polícia militar e com uma horda
estúpida e irracional que brada pela volta da ditadura.
Jamais imaginei
que veria algo assim por cá. Pois, cá estamos, perigosamente flertando com um
país irracional e violento. Um país que me dá ânsia de vômito...Blahhhhhhhh.
Aguardemos o 7
de setembro...
Obs.: para os
apoiadores do atual presidente vai aqui a definição clara do que vem a ser um
calhorda.
ca·lhor·da
(origem
duvidosa)
substantivo de
dois gêneros
1.
[Pejorativo] Pessoa desprezível. =
CANALHA, PATIFE, PULHA
adjetivo de dois
gêneros
2. [Pejorativo]
Que é desprezível ou de baixo nível moral (ex.:
ato calhorda).
"calhorda",
in Dicionário Priberam da Língua Portuguesa [em linha], 2008-2021.
terça-feira, 24 de agosto de 2021
Breves
Breves
A água do chuveiro escorre lentamente pelas costas
a romper as leis da física que dizem respeito ao espaço-tempo
desrespeitando a gravidade.
Minutos gordos e preguiçosos trazem consigo milhares de
segundos
dormidos.
Fecho os olhos enquanto
a água morna leva consigo todo o cansaço desta vida inteira.
Penso na importância de toda a minha existência desimportante,
breve,
pequena.
A importância de nossa existência não me parece relativa
nesse momento...
a sei nula sentindo a água morna nas costas;
insignificante.
Uma pedra tem uma existência maior e mais real do que
todos aqueles
pelos quais irei chorar a perda.
Estaremos todos mortos em um par de centenas de anos, porém, imóveis e tranquilas,
as pedras organizadas por mim no jardim ainda estarão por aqui.
A ilusão que construímos sobre o significado da humanidade é
curiosa e interessante;
nos achamos insubstituíveis
quando na verdade
somos completamente dispensáveis nesse Mundo.