quarta-feira, 29 de janeiro de 2020

O Pensar



O Pensar

Queria não pensar tanto tempo em ti
mas penso
queria não pensar em ti
tanto tempo todo santo dia assim
mas penso
penso
penso em ti como penso no mundo inteiro
nas grandes alegrias da vida e
nas desgraceiras diletantes que a alma humana
permeia
penso nas saudades de tudo que não vivemos
na alegria que desconheço
e nos feitos futuros perdidos porque nunca houve para eles
tempo
penso tão racionalmente em tudo e por isso
me assusto
para onde foram os rompantes e os soluços sem sentido?
Onde está o drama que por anos caminhou comigo?
Acabou o amor sem fim? Não... Sim
Não sei. Não sei o nome do sentimento que caminha
arrastando seus pés pesados
em mim
apego?
Me apego racionalmente a inexistente paixão eterna
e ainda sem compreender as razões do amor
em ti penso

quinta-feira, 23 de janeiro de 2020

Sobre o amor...




E Vinícius de Moraes

Soneto de separação

De repente do riso fez-se o pranto
Silencioso e branco como a bruma
E das bocas unidas fez-se a espuma
E das mãos espalmadas fez-se o espanto.

De repente da calma fez-se o vento
Que dos olhos desfez a última chama
E da paixão fez-se o pressentimento
E do momento imóvel fez-se o drama.

De repente, não mais que de repente
Fez-se de triste o que se fez amante
E de sozinho o que se fez contente.

Fez-se do amigo próximo o distante
Fez-se da vida uma aventura errante
De repente, não mais que de repente.

Tomara

Tomara
Que você volte depressa
Que você não se despeça
Nunca mais do meu carinho
E chore, se arrependa
E pense muito
Que é melhor se sofrer junto
Que viver feliz sozinho

Tomara
Que a tristeza te convença
Que a saudade não compensa
E que a ausência não dá paz
E o verdadeiro amor de quem se ama
Tece a mesma antiga trama
Que não se desfaz

E a coisa mais divina
Que há no mundo
É viver cada segundo
Como nunca mais…


Soneto de fidelidade

De tudo ao meu amor serei atento
Antes, e com tal zelo, e sempre, e tanto
Que mesmo em face do maior encanto
Dele se encante mais meu pensamento.

Quero vivê-lo em cada vão momento
E em seu louvor hei de espalhar meu canto
E rir meu riso e derramar meu pranto
Ao seu pesar ou seu contentamento

E assim, quando mais tarde me procure
Quem sabe a morte, angústia de quem vive
Quem sabe a solidão, fim de quem ama

Eu possa me dizer do amor (que tive):
Que não seja imortal, posto que é chama
Mas que seja infinito enquanto dure.


Eu sei que vou te amar

Eu sei que vou te amar
Por toda a minha vida eu vou te amar
Em cada despedida eu vou te amar
Desesperadamente
Eu sei que vou te amar

E cada verso meu será pra te dizer
Que eu sei que vou te amar
Por toda a minha vida

Eu sei que vou chorar
A cada ausência tua eu vou chorar,
Mas cada volta tua há de apagar
O que essa ausência tua me causou

Eu sei que vou sofrer
A eterna desventura de viver a espera
De viver ao lado teu
Por toda a minha vida.

quarta-feira, 15 de janeiro de 2020

Querer


Querer

Queria abrir meus braços para que
neles
Você coubesse sem esforço
Calado
Simples, uma questão lógico de a medida certa
eu ter
Para que tranquilo no meio do meu abraço
frouxo laço
Criado pelo meu corpo
meus braços
Você pudesse descansar
Enquanto, de olhos apertados
no escuro,
Eu pudesse enxergar que a vida
boa, morna,
tranquila
e oceânica
Faz-me crer na capacidade inesgotável
de além mar o meu mundo continuar.

domingo, 12 de janeiro de 2020

O Paraíso Particular




O Paraíso Particular

O paraíso não existe enquanto localização geográfica real e nunca existiu, a menos que acreditemos em Adão e Eva e na doce maça. O que não é o meu caso. Entretanto, a verdade é que podemos criar um paraíso particular e único, vez ou outra, sem muito esforço. O paraíso, apesar de não existir, pode ser real apesar de finito. Sim, a felicidade e o tal paraíso são efêmeros como nos ensinaram Vinícius de Moraes e Antônio Carlos Jobim: “tristeza não tem fim, felicidade sim”. E, por isso, eles nos são tão caros.

Por volta dos trinta anos descobri que as crianças são a garantia da sanidade mental de qualquer adulto. Sim, eles nos enlouquecem porém, e ao mesmo tempo, são aquilo que não nos deixa de fato enlouquecer. Sendo assim, desde então, fujo para a segurança dos meus miúdos sempre que posso para com eles, sem muito esforço, compreender que a vida é bonita e que a felicidade existe sempre. Apenas anda escondida.

Alguns dos miúdos já cresceram. E de uma coisa tenho certeza: é muito bom vê-los grandes, gente feita, a tomarem decisões bem longe das nossas asas. Dói, verdade também. Mas este é um sentimento agridoce que mistura a nossa carência por não os termos mais grudados na gente e o enorme orgulho que sentimos ao vê-los caminhando sozinhos. C’est la vie!

Pois, me despedi de 2019, ano tão difícil, e vi 2020 chegar em grande estilo no meu paraíso: com Nico e Vitória sem me lembrar de que o mundo existe. Nada de festas, bebidas, roupas certas e ou quaisquer preocupações. Nada de Donald Trump ou do Seu Jair, nada de morte ou de guerra, nada de problemas para além de como fazer com que eles se alimentassem bem e não ficassem doentes. E foram tantas as brincadeiras e tantas as risadas que ainda agora consigo ouvi-las ecoando dentro de mim; as risadas que apenas as crianças sabem dar. Elas são o meu paraíso particular.

Sapiência




sexta-feira, 10 de janeiro de 2020

Carta de Amor




Carta de Amor


A última carta de amor

nasce em forma de poesia com poucas linhas

torta

como a vida

para contar sobre todo o sentimento feito de ideais

e fantasia

Assim, sem poder alongar o tempo

em um minuto fica dito que o tal amor

desterrado

é infinito para além de mim

de ti

Amor doce, triste e verdadeiro

sem direito a beijos e abraços

aos braços

mãos

e adeus

terça-feira, 7 de janeiro de 2020

Meu Carlos




As Sem-Razões do Amor

Eu te amo porque te amo.
Não precisas ser amante,
e nem sempre sabes sê-lo.
Eu te amo porque te amo.
Amor é estado de graça
e com amor não se paga.

Amor é dado de graça,
é semeado no vento,
na cachoeira, no eclipse.
Amor foge a dicionários
e a regulamentos vários.

Eu te amo porque não amo
bastante ou de mais a mim.
Porque amor não se troca,
não se conjuga nem se ama.
Porque amor é amor a nada,
feliz e forte em si mesmo.

Amor é primo da morte,
e da morte vencedor,
por mais que o matem (e matam)
a cada instante de amor.



Amar

Que pode uma criatura senão,
entre criaturas, amar?
amar e esquecer, amar e malamar,
amar, desamar, amar?
sempre, e até de olhos vidrados, amar?

Que pode, pergunto, o ser amoroso,
sozinho, em rotação universal,
senão rodar também, e amar?
amar o que o mar traz à praia,
o que ele sepulta, e o que, na brisa marinha,
é sal, ou precisão de amor, ou simples ânsia?

Amar solenemente as palmas do deserto,
o que é entrega ou adoração expectante,
e amar o inóspito, o cru,
um vaso sem flor, um chão de ferro,
e o peito inerte, e a rua vista em sonho, e
uma ave de rapina.

Este o nosso destino: amor sem conta,
distribuído pelas coisas pérfidas ou nulas,
doação ilimitada a uma completa ingratidão,
e na concha vazia do amor a procura medrosa,
paciente, de mais e mais amor.

Amar a nossa falta mesma de amor,
e na secura nossa amar a água implícita,
e o beijo tácito, e a sede infinita.



Os Ombros Suportam o Mundo

Chega um tempo em que não se diz mais: meu Deus.
Tempo de absoluta depuração.
Tempo em que não se diz mais: meu amor.
Porque o amor resultou inútil.
E os olhos não choram.
E as mãos tecem apenas o rude trabalho.
E o coração está seco.

Em vão mulheres batem à porta, não abrirás.
Ficaste sozinho, a luz apagou-se,
mas na sombra teus olhos resplandecem enormes.
És todo certeza, já não sabes sofrer.
E nada esperas de teus amigos.

Pouco importa venha a velhice, que é a velhice?
Teus ombros suportam o mundo
e ele não pesa mais que a mão de uma criança.
As guerras, as fomes, as discussões dentro dos edifícios
provam apenas que a vida prossegue
e nem todos se libertaram ainda.
Alguns, achando bárbaro o espetáculo
prefeririam (os delicados) morrer.
Chegou um tempo em que não adianta morrer.
Chegou um tempo em que a vida é uma ordem.
A vida apenas, sem mistificação.



José

E agora, José?
A festa acabou,
a luz apagou,
o povo sumiu,
a noite esfriou,
e agora, José?
e agora, você?
você que é sem nome,
que zomba dos outros,
você que faz versos,
que ama, protesta?
e agora, José?

Está sem mulher,
está sem discurso,
está sem carinho,
já não pode beber,
já não pode fumar,
cuspir já não pode,
a noite esfriou,
o dia não veio,
o bonde não veio,
o riso não veio,
não veio a utopia
e tudo acabou
e tudo fugiu
e tudo mofou,
e agora, José?

E agora, José?
Sua doce palavra,
seu instante de febre,
sua gula e jejum,
sua biblioteca,
sua lavra de ouro,
seu terno de vidro,
sua incoerência,
seu ódio — e agora?

Com a chave na mão
quer abrir a porta,
não existe porta;
quer morrer no mar,
mas o mar secou;
quer ir para Minas,
Minas não há mais.
José, e agora?

Se você gritasse,
se você gemesse,
se você tocasse
a valsa vienense,
se você dormisse,
se você cansasse,
se você morresse...
Mas você não morre,
você é duro, José!

Sozinho no escuro
qual bicho-do-mato,
sem teogonia,
sem parede nua
para se encostar,
sem cavalo preto
que fuja a galope,
você marcha, José!
José, para onde?