sexta-feira, 27 de novembro de 2015

O Poeta


O Poeta

O poeta de pernas bambas samba, desengonçado,
no meio da praça com seus pés desobedientes;
donos de si.
Sem saber o que fazer com seus poemas e com suas palavras
depois de partido o peito.
O poeta subiu as ladeiras para tentar encontrar qualquer resposta;
mesmo as não verdadeiras, no fundo dos copos, no meio das conversas
dos amigos, em braços, bocas e pernas alheias.
Pobre poeta afogou-se, desapercebidamente e por vontade própria, em seus próprios
sentimentos criativos e inspiradores até,
contraditoriamente,
ver-se secar por dentro. Nada mais sai dele; há nele.
Sem poemas, sem versos, sem palavras ou letras,
sem sonhos e paixões infinitas, o poeta errante deixou suas mãos de lado,
calou-as com um soco, de um susto. Pois, depois de tão grande e profunda crença,
viu minguar sua alma de poeta e todas as flores que o acompanharam pelo
caminho.
Mudo, ele segue esquecido de si próprio no meio da praça
a deixar de ser quem ele verdadeiramente é; a esquecer-se.
Deixando-se levar por seus pés que nada sentem ou sabem dizer
no seu parvo balé
solo.

segunda-feira, 23 de novembro de 2015

Emicida - Boa Esperança (A Revolução)




Boa Esperança
Emicida
 
Por mais que você corra, irmão
Pra sua guerra vão nem se lixar
Esse é o xis da questão
Já viu eles chorar pela cor do orixá?
E os camburão o que são?
Negreiros a retraficar
Favela ainda é senzala, Jão!
Bomba relógio prestes a estourar

O tempero do mar foi lágrima de preto
Papo reto como esqueletos de outro dialeto
Só desafeto, vida de inseto, imundo
Indenização? Fama de vagabundo
Nação sem teto, Angola, Keto, Congo, Soweto
A cor de Eto'o, maioria nos gueto
Monstro sequestro, capta-tês, rapta
Violência se adapta, um dia ela volta pu cêis
Tipo campos de concentração, prantos em vão
Quis vida digna, estigma, indignação
O trabalho liberta (ou não)
Com essa frase quase que os nazi, varre os judeu – extinção

Depressão no convés
Há quanto tempo nóiz se fode e tem que rir depois
Pique Jack-ass, mistério tipo lago Ness
Sério és, tema da faculdade em que não pode por os pés
Vocês sabem, eu sei
Que até Bin Laden é made in USA
Tempo doido onde a KKK, veste Obey (é quente memo)
Pode olhar num falei?

Aê, nessa equação, chata, polícia mata – Plow!
Médico salva? Não!
Por quê? Cor de ladrão
Desacato, invenção, maldosa intenção
Cabulosa inversão, jornal distorção
Meu sangue na mão dos radical cristão
Transcendental questão, não choca opinião
Silêncio e cara no chão, conhece?
Perseguição se esquece? Tanta agressão enlouquece
Vence o Datena com luto e audiência
Cura, baixa escolaridade com auto de resistência
Pois na era Cyber, cêis vai ler
Os livro que roubou nosso passado igual alzheimer, e vai ver
Que eu faço igual burkina faso
Nóiz quer ser dono do circo
Cansamos da vida de palhaço
É tipo Moisés e os Hebreus, pés no breu
Onde o inimigo é quem decide quando ofendeu
(Cê é loco meu!)
No veneno igual água e sódio (vai, vai, vai)
Vai vendo sem custódio
Aguarde cenas no próximo episódio
Cês diz que nosso pau é grande
Espera até ver nosso ódio

Por mais que você corra, irmão
Pra sua guerra vão nem se lixar
Esse é o xis da questão
Já viu eles chorar pela cor do orixá?
E os camburão o que são?
Negreiros a retraficar
Favela ainda é senzala, Jão

Bomba relógio prestes a estourar


domingo, 22 de novembro de 2015

Uma Carta para Ti



Uma carta para Ti

Ontem passamos teu primeiro aniversário sem ti, Mima. Estranho isso. Estranho não ter para quem dar o tal do Feliz Aniversário direito, não ter presente para comprar, não haver um bolo a fazer. Foi estranho como foi estranho o meu aniversário sem ti este ano. Como estranho será celebrar o Natal e ver o próximo ano chegar. A vida segue, claro, e estamos bem. Contudo há esta saudade doída e uma pequena tristeza que nos acompanha e que fala mais alto nos momentos nos quais estaríamos todos juntos.

Muita coisa aconteceu depois de você ter ido para o seu além-mar celestial; coisas bonitas e coisas horríveis. Toda vez que algo triste acontece me conforta o fato de você não estar aqui para vê-las e penso: ainda bem que a Mima não viu toda esta tristeza. As bonitas eu espero que você possa ver daí dando uma espichadela de olhos para cá. Ver, por exemplo, que a Vitória está crescendo linda, que o Nícolas está a cada dia mais falante e esperto, que o Papai vai bem apesar de ainda estar um tanto amuado. Ele tem se esforçado muito, mãe; muito mesmo. O Sérgio e eu estamos bem.

Sabe Mima, toda vez que rio alto me lembro de ti. Lembro-me da tua risada feliz e cheia e te imagino rindo muito aí. Imagino-te com a vovó Estela, com todos os meus avôs e seus irmãos e te sinto muito feliz. Apenas acho muito chato isso de não haver qualquer forma de te ouvir e ver. Faz-me muita falta a tua voz, e a melhor invenção do mundo, atualmente, seria um telefone ou uma internet que pudesse nos conectar. Se encontrar aí o senhor Steve Jobs, veja se ele não pode nos ajudar com muita inspiração, tá bom?


Mima, desculpa o meu atraso para te escrever. Queria ter escrito ontem, porém, não consegui. Contudo, tenha certeza de que me lembrei de ti o dia todo, desde o momento no qual abri meus olhos. Amo-te, mãe, e isso não mudará nunca e vale para cá e para o além. Feliz Aniversário Mima!

quarta-feira, 18 de novembro de 2015

Tristeza



Tristeza


Beija-flor, sapo, salamandra, borboleta,
e toda a sua parentada,
do menor bicho possível até aquele que é grande que só,
andam amuados lá pelas bandas dos Gerais.
Ver peixe a fugir do rio na tentativa de respirar corta o coração
de todo o ser vivente sem
fazer falta a tal da racionalidade acadêmica ou científica
para qualquer explicação.
Nossa Terra foi ferida e de bicho a gente, tudo e todos,
viram com olhos arregalados e coração aflito o mundo sumir
sob a lama de um repente.
Um mar de lama suja, mar criado por homens ricos,
arrogantes e irresponsáveis (que se pensam importantes,
porque a riqueza dá às pessoas a falsa impressão de que nada tem mais importância
do que eles)
cobriu um mundão nas Gerais
e afogou o rio,
e roubou as casas
e levou a vida, numa enxurrada ignorante,
de um bom bocado de gente.

domingo, 15 de novembro de 2015

Poesia Para Dias Turvos



A FLOR E A NÁUSEA

Preso à minha classe e a algumas roupas,
vou de branco pela rua cinzenta.
Melancolias, mercadorias espreitam-me.
Devo seguir até o enjôo?
Posso, sem armas, revoltar-me?
Olhos sujos no relógio da torre:
Não, o tempo não chegou de completa justiça.
O tempo é ainda de fezes, maus poemas, alucinações e espera.
O tempo pobre, o poeta pobre
fundem-se no mesmo impasse.
Em vão me tento explicar, os muros são surdos.
Sob a pele das palavras há cifras e códigos.
O sol consola os doentes e não os renova.
As coisas. Que tristes são as coisas, consideradas sem ênfase.
Uma flor nasceu na rua!
Vomitar esse tédio sobre a cidade.
Quarenta anos e nenhum problema
resolvido, sequer colocado.
Nenhuma carta escrita nem recebida.
Todos os homens voltam para casa.
Estão menos livres mas levam jornais
E soletram o mundo, sabendo que o perdem.
Crimes da terra, como perdoá-los?
Tomei parte em muitos, outros escondi.
Alguns achei belos, foram publicados.
Crimes suaves, que ajudam a viver.
Ração diária de erro, distribuída em casa.
Os ferozes padeiros do mal.
Os ferozes leiteiros do mal.
Pôr fogo em tudo, inclusive em mim.
Ao menino de 1918 chamavam anarquista.
Porém meu ódio é o melhor de mim.
Com ele me salvo
e dou a poucos uma esperança mínima.
Passem de longe, bondes, ônibus, rio de aço do tráfego.
Uma flor ainda desbotada
ilude a polícia, rompe o asfalto.
Façam completo silêncio, paralisem os negócios,
garanto que uma flor nasceu.
Sua cor não se percebe.
Suas pétalas não se abrem.
Seu nome não está nos livros.
É feia. Mas é realmente uma flor.
Sento-me no chão da capital do país às cinco horas da tarde
e lentamente passo a mão nessa forma insegura.
Do lado das montanhas, nuvens maciças avolumam-se.
Pequenos pontos brancos movem-se no mar, galinhas em pânico.
É feia. Mas é uma flor. Furou o asfalto, o tédio, o nojo e o ódio.


De Carlos Drummond de Andrade 
Mineiro e antigo, atual e a retratar o homem do Mundo

quarta-feira, 11 de novembro de 2015

O Tempo (5)



O Tempo

Meses, anos, dias, horas...
horas, dias, meses e, depois de uma pausa um pouco mais longa
dos olhos, serão anos.
Não sei se o tempo faz diferença, se algum dia,
depois que os anos já puderem ser contados às dezenas,
ele fará alguma diferença. Uma diferença qualquer.
Não sei.
Se a saudade é alimentada pela ausência e
se esta, por sua vez, amplia seus espaços com o tempo;
como poderá, um dia, todo o tempo passado fazer diferença?
Não sei.
Talvez, com o tempo,
horas
dias
meses
anos e suas dezenas
apenas aprendamos a fingir melhor, para nós mesmos,
não sentir
o que, independente de todo o tempo,
ainda sentimos do mesmo jeito
com nossos ponteiros de relógio imóveis.

domingo, 8 de novembro de 2015

O país dos calhordas


O país dos calhordas

Calhorda, no dicionário, significa: pessoa desprezível ou de baixo nível moral. Aqui no Brasil o vocábulo ganhou novos contornos e anda a ser um sinônimo mui utilizado para nomear os políticos que nos representam. No Brasil político é sinônimo de calhorda. É verdade que não é bem assim, e que boa parte da classe política deste país está cheia de boas intenções, apesar de agir muito pouco em sua maioria. Contudo, não há como negar que estamos metidos numa espécie de show de horrores no que diz respeito aos que nos governam, pois, não precisamos prestar muita atenção para percebermos que temos, espalhados por todos os antros e cargos públicos desta Nação, ladrões de carreira, evangélicos retrógrados de carteirinha, mentirosos contumazes, corruptos crônicos, prevaricadores, chupins com pouca massa cinzenta e os oportunistas anjos-do-pau-oco de costume.

Por estes dias, o Cara-de-Pau bola da vez, o Sr. Eduardo Cunha, deu uma entrevista para padre ver, (no caso dele pastor evangélico), a demonstrar com sua conversinha para boi dormir que ele nunca fez nadica de nada errado na vida. E, à la Maluf, explicou que nunca mentiu sobre não ter o dinheiro no exterior que ele deveras tem. Todo santo-empresário-do-bem, Cunha explicou que tanto dinheiro foi ganho com a venda de carne e outros alimentos ao Congo, apesar de não haver como prová-lo já que isso ocorreu no século passado e a tal empresa não existe mais. E que é natural que ele não possa explicar parte do dinheiro “em seu nome”, pois, e de fato, ele não sabe direito de onde veem os US$ 1,3 milhões em depósitos feitos em suas contas, que não são suas; porque ele, Cunha, não as administra e é, apenas, aquele que pode usufruir do dinheiro todo.

A primeira pergunta que me vem à cabeça, depois de ouvir a entrevista, é por que será que na minha conta, aqui no Brasil mesmo, nunca nenhum dinheiro jamais foi depositado por milagre sem que eu soubesse de onde vinha? E sinto-me tão pobre que acho que o certo, atualmente, é criarmos algumas novas classes para descrever os tipos de gentes aqui no Brasil, porque isso de classe A B C e D não dá mais conta da disparidade de dinheiro que existe entre quem trabalha e produz algo e aqueles que governam este país. Acho que devemos deixar a timidez de lado e irmos, sem qualquer pudor, até o Z, não?

A segunda pergunta que me vem à cabeça, na atual conjuntura, é: ainda é feio e pecado darmos uns bons tapas na cara dos políticos em meu país ou isso já começa a ser visto como um ato honrado? Pergunto porque o limite de indignação anda a níveis estratosféricos e a paciência, pelo menos a minha e a de muita gente que eu conheço, já acabou faz um par de anos; pelo menos.


Chistes à parte, a verdade é que andamos a afundar o país na merda mais uma vez, infelizmente, e que isso é algo muito ruim para todos nós. Pois nós, os brasileiros de pouco dinheiro, vivemos num país violento, injusto e sem infra-estrutura que reserva aos seus cidadãos com pouca grana uma vida, no mínimo, difícil. Claro é que o senhor Cunha não é o único, ele é apenas um de um bando cruel que nos assalta há anos. Porém, o mais importante é lembrarmos que somos nós os que damos a eles o poder e os cargos dos quais agora tiram todo o proveito possível. Então, mesmo que demore um pouco, e se começarmos a prestar mais e mais atenção em tudo que se passa por aqui, nas urnas poderemos retirar toda essa gente podre que grassa e desgraça no Planalto Central e adjacências.


quinta-feira, 5 de novembro de 2015

O Último Poema





O que dizer de um filme que me fez chorar assim que iniciou seu trailer?



Caixas de lenços serão necessárias na sala de cinema.

                                                   Um filme feito para quem ama a poesia e as palavras

Cartas, uma paixão sem tempo nem espaço definido e, portanto, eterna.

                    Drummond, um homem que eu deveria ter conhecido.


terça-feira, 3 de novembro de 2015

Últimos



Últimos

O último dia acontece como se nada fosse,
sem avisos,
e como um outro dia qualquer.
Tão trivial como qualquer outro, disfarçado em dia comum,
convida-nos ao engano de achar que ainda temos tempo;
que ainda nos sobra muito tempo.
As últimas horas acontecem como se nada fossem,
silenciosas.
Sem sinais claros de que já não haverá dias ou noites a velar,
fazemos planos tolos para os próximos meses,
para esta semana,
para a tarde que mal começara.
Horas pardas passadas como tantas horas às quais não damos atenção
e que fluem como brisa,
livres
ligeiras
profanas.
Os últimos minutos chegam e não os notamos. Eu não
percebi;
e apenas agora compreendo o quanto ainda não vejo.
Faltou-me a calma e a delicadeza
dos que reconhecem mais claramente o escorrer do tempo
por entre os dedos.
E os últimos minutos passaram despercebidos e velozes para serem lembrados,
por mim,
por todos os anos. Pela vida inteira.