segunda-feira, 29 de setembro de 2014

Verdade




Chegando a hora da verdade, de descobrir 
sem qualquer felicidade
a verdade que a carne 
escondia...

Descobre-se o medo.

Já que aquilo que os olhos não podiam ver
e que, portanto, o coração não sentia,
não chegava a ser
realidade.

O não saber acalentava e iludia.

Chegando a hora da verdade, de ser dito
aquilo que lá no fundo já se sabia:
a mais crua e nua verdade.
A verdade é que de verdade
algumas verdades nunca deveriam 
ser ditas.

sexta-feira, 19 de setembro de 2014

Setembro Diferente

Meus pais.



Tenho por tradição viajar no mês de Setembro. Este é o mês de meu aniversário e, por isso mesmo, gosto de tirar férias da minha vida de todo dia e dar-me de presente uma vida diferente por um tempo; mesmo que breve. Gosto de ver gente que nunca vi, de pisar em terras novas, de descobrir um pouco do tudo que existe para além do meu jardim. Assim tem sido há anos: todo Setembro, tal andorinha, bato as asas por aí.

Contudo, neste ano as férias estão a mostrar-se algo diferente. Alheias a minha vontade, estas férias se mostram um tempo de olhar para dentro, para os que eu já conheço e amo muito. Então, ao invés do meu egoísta prazer pensado para satisfazer o próprio umbigo, este tem sido um tempo de ser e estar para os outros. Um momento difícil e, curiosamente, bonito ao mesmo tempo. Por motivos que apenas Deus deve saber, porque para mim tudo chegou sem pedir muita licença ou explicação, este Setembro tem sido diferente.

Os primeiros 15 dias do mês foram passados com meus miúdos, meus afilhados de fato ou de coração, meus filhos de conto de fadas. Amo-os muito, e ser responsável por eles por alguns dias é cansativo, é complicado, mas é, mais e acima de tudo, um prazer sem igual. Vê-los tão de perto e partilhar da rotina deles amplia nosso carinho e agiganta o coração. Quanto mais tempo estou com eles mais os amo e mais saudades sinto quando nos separamos. Os miúdos são uma linda visão do futuro, são todas as possibilidades que a vida tem, são a fantasia e a felicidade feitas em carne e osso; eles são a alegria em forma de gente pequena.

Agora, nos últimos 15 dias do mês, estou a cuidar de minha mãe que, de repente, adoeceu.  Talvez não tenha sido tão de repente assim, pois o fato é que depois de tantas voltas dadas pelo mundo, minha mãe já não é mais uma menina mesmo que eu teime em vê-la sempre assim - jovem. O fato é que a coisa toda me é estranha, uma novidade sem igual, já que foi sempre ela que cuidou de mim. E sei que a amo muito, porém o medo de perdê-la e toda a situação que se apresenta me fazem ver mais claramente o quão importante ela é para mim. Minha mãe e meu pai são o centro do mundo que eu chamo de meu; eles são meu sol, minha terra firme. Eles são tudo o que já fui e aquilo o que eu chamo primordialmente de lar. Minha mãe e meu pai juntos são a minha casa em forma de gente.


Eu ainda não sei o que Outubro me trará, não quero pensar muito nisso. Ou melhor, não consigo fazê-lo. Quero apenas, e sem grandes ambições, estar com os que amo e ser, mais do que de costume, uma parte da vida deles.

terça-feira, 16 de setembro de 2014

ainda

eu não quero te ver numa cama:

deitada

parada

calada.

eu não quero

cedo ou tarde, não importa.

será sempre cedo para mim

e o medo,

o meu medo desta vida e da tua ida,

ainda me devora.

eu não quero te ver assim tão quieta e imaginar

que cedo podes  deixar de ser minha.

mãe, eu ainda sou a filha.


segunda-feira, 8 de setembro de 2014

O silêncio





Por vezes

Às vezes

Sempre

O ensurdecedor silêncio enlouquece-me

E nos dias, nos meses, nos anos  sem palavras,

Afogo-me

No vazio deste silêncio nosso

que deixa-me

cega

e muda.

Onde, aos poucos, deixo de ser.




segunda-feira, 1 de setembro de 2014

Dias de Madrinha

Os miúdos a acordar e seus humores ;)


Ser madrinha, como ser pai, mãe, avó, avô, tio e qualquer outra palavra que indique termos afeto pelos pequenos nos afasta um pouco de nosso eu individual.  Nos momentos nos quais não respondemos mais por nossos nomes de batismo, tal Clark Kent deixando de ser ele mesmo para ser o Super Homem, opera-se em nós uma transformação um tanto alheia à nossa vontade. Deixamos um pouco de ser os seres egocêntricos, reencarnações do Rei Sol ao redor do qual gira o mundo, e nos vemos à mercê das necessidades alheias. Por vontade própria, porém e ao mesmo tempo pela vontade alheia, nos damos de alma e coração aos pequenos que amamos e, por eles, nos transformamos em pessoas melhores.

Por isso, nos próximos 10 dias, dias de madrinha em tempo integral, faltar-me-á o tempo para tudo aquilo que diz respeito ao meu próprio umbigo, contudo, sobrará  espaço para uma das alegrias mais doces desta vida: ser dos meus pequenos. Fato que pode parecer difícil e pesado para muitos, mas que para mim significa ter umas boas férias de mim mesma e de meus problemas enquanto os pais dos miúdos tiram férias da vida que a eles pertence para namorar um pouco uma vez mais,

Portanto, ao invés do trabalho de todo santo dia, dos jornais, livros e revistas, dos filmes, das mesas de bar e da ginástica, nesta semana teremos idas e vindas à escola, discussões sobre as lições de casa não feitas e sobre o fato de ainda haver comida no prato. Serão dias de jogos, aventuras, vídeo games, bola e muito desenho animado. Uma boa mudança, não? Claro que sim! Pois, para além de boa, esta é uma oportunidade única quando lembramos que o tempo não para e que há momentos que não poderão ser repetidos através dos anos mesmo que queiramos muito.

Então, por estes dias, o corriqueiro e o banal ganhará ares de fato raro e especial. Assim, tornam-se especiais os abraços na saída do colégio, as risadas descabidas, as bobagens desmedidas. Transformam-se em preciosidades as discussões ganhas por mim como as por mim perdidas, e são bênçãos as carinhas de cabelos desgrenhados pela manhã. Nestes dias, dias de uma responsabilidade gigante e de uma rotina contada pelo relógio, a verdade verdadeira é que eu deixo de ser um pouco quem sou hoje em dia e volto a ser menina.

 Benditos são os dias de madrinha, dias de felicidade explícita!