sábado, 28 de janeiro de 2012

terça-feira, 24 de janeiro de 2012

eSSes

Os meus esses arrastam-se ,
sinuosas
        serpentes
sibilantes
       a sussurrar
suaves sons
    que jamais pertencerão
aos céus.
Os teus esses me chegam
com sons cheios
de chocalhos e chuvas
conchas e sonhos
 numa enchente
colorida de muxoxos
 que jamais serão meus.

segunda-feira, 23 de janeiro de 2012

A História de João e Valéria (parte 7)


7
Havia dias Valéria não saia de casa, e sua mãe sentia-se muito mal por ver sua filha sofrer assim. Sim, porque não há maior dor para uma mãe, mesmo as borboletas, do que ver que a tristeza anda a morar no coração de um filho seu. Valéria estava triste e sua mãe estava triste também. Por isso, mesmo achando a tal viagem a idéia mais maluca deste mundo, Dona Maria decidiu que tinha que conversar com sua filha.
“Valéria, minha leoa pequenita, até quando você vai ficar assim, tão murchinha? Não agüento mais te ver deste jeito, sem sair para voar por aí. O que você quer minha filha? Diz-me.” Valéria tinha seus olhos pregados no chão quando sua mãe entrou em seu quarto, e desta mesma maneira eles continuaram; a borboletinha não tinha vontade de responder.
Vendo isso, a mãe da borboleta amarela deixou de lado sua braveza e o medo de que algo de mal acontecesse com sua filha. Sentou-se a seu lado e disse: “Minha filhinha, te amo mais do que tudo nesta vida e não quero te ver triste deste jeito. Então, mesmo que esta história de viagem pelo mundo seja uma loucura para mim, se é o que você realmente deseja, eu deixo-te ir.”
Valéria não acreditava no que ouvia. “Jura mãe? Você me deixa ir?” A mãe de Valéria balançou a cabeça positivamente, e abraçou sua filha com carinho de mãe. Abraçou-a e ajudou Valéria a montar uma pequena mala para a viagem de sua vida. Nela, além de algumas roupas, o iPod e um diário onde a menina borboleta escreveria todas as aventuras que ela viveria, ia também uma foto de Dona Maria.
As duas chegaram ao jardim juntas e lá, depois de alguns minutos, encontraram João sentado, muito amuado, no galho da jabuticabeira. Mas, no mesmo segundo em que viu Valéria chegando de mochila nas costas com sua mãe, toda a alegria do mundo encheu o seu corpo de passarinho. Ele sabia que a mãe da amiga borboleta tinha mudado de idéia, e a aventura dos amigos começaria.
João abraçou as duas borboletas e agradeceu muito à Dona Maria, prometendo cuidar muito da amiga amarela. “A senhora pode deixar comigo, nada de mal acontecerá com a sua filha, eu cuidarei dela bem direitinho.” A mãe borboleta, de coração apertado, desejou muita sorte para a dupla de amigos. A história de João e Valéria, com todas as suas aventuras, estava em seu começo.
Fim.

A História de João e Valéria (parte 6)


6
Maria, a mãe de Valéria, havia ouvido toda a explicação de sua filha, mas não estava nada convencida de que poderia confiar naquele sabiá. Como poderia ela? Afinal, sabiás costumavam comer insetos e nisso incluíam-se as pequenas borboletas também. Como acreditar que sua pequena não serviria, no meio da aventura maluca dos dois, como um lanche da tarde para o passarinho que se passava por seu amigo?
Por isso, apesar do medo que corria em suas veias, a mãe borboleta decidiu enfrentar, sozinha, o inimigo. Por isso, apareceu na sala com a cara mais brava que conhecia, fingindo não sentir medo algum. E, assim que olhou bem direto nos olhos do João, foi logo perguntando que maluquice era aquela.
“Que bobagem é esta que acabou de me dizer a minha Valéria? Que história é essa de que vocês, os dois, vão sair pelo mundo numa aventura? Digo logo que não vão, não senhor! Você acha que eu sou boba? Acha que não sei que pássaros como você comem borboletas como nós? Estão loucos! Não vão e ponto final!”
Enquanto brigava com João, Maria não reparou na tristeza sentida que nascia na cara do sabiá. João ficara realmente triste, tão triste que seus olhos pareciam prontos para chorar. Vendo aquilo, Maria parou de gritar com sua voz pouca de borboleta e, foi então que falou o João.
“Desculpe-me.” Pediu João. “Sei que a senhora tem razão. Mas, eu nunca comi nenhuma borboleta porque acho que vocês são as criaturas mais bonitas que eu já vi. Juro para a Senhora. Vi a Valéria tão triste, e triste andava eu também, tão só. Por isso, quis falar com ela lá no jardim. Quis saber que tristeza era aquela que se parecia tanto com a minha.”
Dona Maria ouviu tudo aquilo e sentiu, sabe-se lá Deus porque, que o passarinho não mentia. Mesmo assim, aquela era uma loucura maluca demais para ela. Onde já se viu uma coisa como essa: um sabiá e uma borboleta a viajar juntos por aí? E, apesar de acreditar nas intenções do João, a mãe de Valéria disse que não. “Você me desculpe passarinho. Mas esta história é sem pé nem cabeça demais. Com você minha filha não vai viajar. Sinto muito, minha resposta é não.”
A porta da casa das borboletas foi aberta, e dela saiu João, triste de dar dó e com os olhos redondos marejados e pequeninos que só. Dentro da casa ficou Valéria a chorar bem baixinho. Ela havia perdido seu amigo e, com ele, seu sonho de conhecer o mundo inteirinho.

A História de João e Valéria (parte 5)


5
Foi mesmo um aperto para o João passar pela porta sob medida para borboletinhas. Mas com muito esforço e deixando para trás algumas de suas penas, ele conseguiu. Porém, o que seus olhos de ave viram assim que entraram na casa da borboleta, valeria passar por mil apertos mais apertados do que aquele. Tudo na casa de Valéria parecia ser feito pelas luzes que entravam pelas muitas janelas espalhadas por toda a pequena caverna que, à luz do dia, mais parecia um sonho de olhos abertos. Um lugar onde tudo parecia iluminado e leve, como se o peso do mundo não reinasse ali.
E os olhos, ai os olhos! Os olhos viam tons que iam do laranja mais forte ao amarelo quase branco, azuis transparentes e verdes tão vivos que pareciam respirar. E havia flores, muitas flores. Flores tão pequenitas que Valéria ficava muito grande perto delas. Flores espalhadas pelo chão que pareciam rendas delicadas e perfeitas, feitas por mãos de fadas do jardim, de um tipo que o sabiá nunca havia visto.
E João estava assim: apaixonado pelo que via, tão distraído pela beleza, que nem notou quando a mãe de Valéria apareceu na sala carregando um prato cheio de gelatina vermelha de framboesa. E foi apenas com o grito, forte e terrível, que saiu da goela dela, que João notou que havia mais alguém ali.
“Aaaaahhhhhh, um mostro aqui!” gritou Dona Maria que, num desespero sem fim, voou para perto de Valéria e puxou-a, arrastando a filha dali. Uma verdadeira confusão feita de gritos e de gelatina vermelha a voar, feito rã num salto, para, logo depois, esparramar-se pelo chão. E João, pela segunda vez no mesmo dia, ficou com cara de parvo sem entender patavina do que passara diante de seus olhos espantados e duvidosos.  Alguns minutos sonolentos haviam passado sem que nenhum ruído se ouvisse. “Ai-ai, o que será agora?” perguntava-se o pássaro quando viu a porta, antes fechada com violência, abrir-se lentamente. Foi nesse minutinho que o sabiá viu a cara de brava de Dona Maria a olhá-lo como se pudesse esmagá-lo com os olhos. Parecia que sairiam raios deles, a La desenho japonês, de tão vermelhos e apertados que eles estavam. Talvez saíssem mesmo as tais chamas de dragão que justificariam o apelido que João dera a ela.


domingo, 22 de janeiro de 2012

Perfeito da Janela para Dentro


Domingo pela manhã e o mundo parece perfeito, ou quase isso, da minha janela para dentro. As meninas, duas cachorras e a passarinha assassina que estão comigo, e eu estamos bem. Elas alimentadas e preguiçosas, eu ouvindo os Beatles ao lado de uma grande quantidade de café que fiz. Só hoje pela manhã me dei conta de que a tal dor de cabeça que me acompanhou ontem o dia todo pudesse ser fruto da falta do mesmo. E era; sou escrava de meu vício de muitos anos.
Mas basta abrir esta outra janela, a eletrônica, para ver que a perfeição está longe, mas muito longe mesmo do mundo para além dos poucos metros deste apartamento. Começamos o ano sem grandes tragédias, e isso já dá certo alívio, não? Nada de milhares de pessoas morrendo de repente devido a grandes terremotos, nenhuma onda gigantesca a inundar meio mundo, e os morros brasileiros parecem não estar dispostos a escorregar este ano outra vez. Contudo, e apesar da mudança do ano, os velhos problemas existem e persistem por um motivo mais do que banal: nós somos o problema.
Então, já estamos nós, a suprema criação divina (de acordo com a nossa egocêntrica visão), a estragar mais um ano novo em folha. Cá estamos nós planejando novas guerras por dinheiro, por religião ou por qualquer outro motivo estúpido demais para qualquer ser que tenha coração entender. E já há atentados com bombas a explodir pelo mundo. E ainda persiste a fome a matar por aqui e por aí, afinal, somos mais de 1 bilhão sem ter o necessário para comer neste planeta de 7 bilhões de almas onde poucos desperdiçam muito.
Concluí-se por isso, que não carecemos de grandes catástrofes enviadas por Deus para que a situação seja difícil, apesar delas venderem mais jornais e revistas e darem mais audiência aos canais de televisão. Pois, se é a ira da natureza que nos assombra em nossas confortáveis casas através da televisão, é a nossa cruel indiferença ao sofrimento continuo e diário que assombra àqueles que padecem à margem deste mundo ao qual eles parecem não pertencer. E, não há horror maior do que ver que o mundo que deveria ser para todos, é, na realidade, para poucos.  E, lá vem a minha dor de cabeça outra vez!
Boa semana, de consciência pesada no meio do verão, e um beijo para todos.

sábado, 21 de janeiro de 2012

Assim Assim

 

Justa

se a vida fosse justa...
se soubéssemos exatamente o que
isso quer dizer.
isso da vida ser justa pra alguém,
pra todos,
pra ninguém. Pra mim.
se pudéssemos não magoar as pessoas...
nunca deixá-las para trás. jamais.
se o meu querer nunca, nunca, nunca
nunca fosse o oposto do querer de alguém...
se... se a vida fosse assim,
não haveria as lágrimas
e a palavra saudade não viveria aqui.

Bússola

Como é de costume,
a bússola apontou para o norte
e ao segui-la, o corpo fez-se em pedaços
divididos:
partes foram,
outras perderam-se pelo caminho,
outras, poucas, ficaram aqui. os pés.
a bússola aponta o norte
e, com alguma sorte, os pés seguirão
o coração e o pensamento
que lá estão há muitos e muitos dias sem fim,
num exílio voluntário e paciente.
eles esperam pelos pés
para que possam regressar
a sua terra, para que possam mais uma vez
constituir um corpo inteiro em si mesmo,
e, simplesmente,
ser
outra vez.

segunda-feira, 16 de janeiro de 2012

sexta-feira, 13 de janeiro de 2012

Saudades de Nelson Rodrigues...

 ... que neste ano teria 100 e que, com certeza, ainda nos encantaria muito com seus absurdos cheios de verdade e poesia.


A mais tola das virtudes é a idade. Que significa ter quinze, dezessete, dezoito ou vinte anos? Há pulhas, há imbecis, há santos, há gênios de todas as idades.

O homem não nasceu para ser grande. Um mínimo de grandeza já o desumaniza. Por exemplo: — um ministro. Não é nada, dirão. Mas o fato de ser ministro já o empalha. É como se ele tivesse algodão por dentro, e não entranhas vivas.
Ou a mulher é fria ou morde. Sem dentada não há amor possível.

Está se deteriorando a bondade brasileira. De quinze em quinze minutos, aumenta o desgaste da nossa delicadeza.

de Nelson Rodrigues

Arte e Crítica





A beleza que se faz muito feia.

quinta-feira, 12 de janeiro de 2012

Carrossel


Entender a alma humana é algo realmente difícil, quiçá impossível mesmo, já que nós próprios não entendemos completamente o famigerado espírito que nos habita. O que passa dentro de nós, sob nossa pele, debaixo de carne, músculos e ossos, muitas vezes foge ao que acreditamos ser certo e lógico; foge daquilo que esperamos de qualquer pessoa e, mais ainda, de nós mesmos. Parecemos parvos aos nossos olhos ao ver que, apesar de tudo o que sabemos depois de tanto visto e aprendido nesta vida, ainda somos tão capazes de atos e sentimentos pueris. Ainda somos completamente capazes ao erro, à ingenuidade e à crença desmedida em nossos devaneios, sonhos e afins.
Contudo, e apesar da ciência deste fato, passamos a vida a tentar encontrar no outro uma alma que não cometa tais gafes terríveis. Como se estes fossem defeitos alheios, como se estas fossem gafes mesmo.  Criticamos esposas e filhos, maridos e amigos, nossos pais e irmãos por suas fraquezas d’alma como se fossemos cruéis senhores de uma razão que, a bem da verdade, não existe. E, para mim, dúvidas fundamentais aparecem cá na cachola: Quando nos tornamos juízes daqueles que mais amamos na vida? Porque julgamos tanto aos outros ao passo que deveríamos tentar entendê-los?
Como somos incrivelmente capazes de não apoiar e ajudar as pessoas mais importantes em nossas vidas simplesmente porque achamos que elas estão erradas? E, ao invés de oferecer nosso colo, ouvidos e carinho, preferimos o julgo, a bronca e os gritos como se estas fossem ferramentas mais eficazes que o amor. Pois, não o são. E cá vai um lembrete para todos nós: somos tão ou mais capazes do que qualquer  um no que diz respeito a cometer erros.
Muito para além de qualquer argumento e razão, creio mesmo que devemos perceber que toda a graça que há em cada um de nós reside em nossos “defeitos de fabricação” que nos tornam únicos. Não fossemos capazes dos absurdos que apenas cada um de nós é capaz, e a vida seria muito chata para todos nós. Como nos apaixonaríamos por alguém sem as maluquices que somente ele ou ela sabem fazer? Como nos sentiríamos necessários sem que os amores de nossas vidas precisassem de nosso apoio aqui ou ali? Como riríamos tanto sem as palhaçadas, os erros e as gafes daqueles que trazem às nossas vidas a alegria que sozinhos jamais poderíamos ter?
Pois, resta-nos ver que errados mesmo estamos nós quando nos esquecemos de que estamos aqui para ajudar antes de, simplesmente, julgar. Não acham? Vamos, por tanto, começar este ano com olhos mais caridosos e inteligentes, mais compreensivos e amigos, mais amorosos e fraternos, e deixemos para os juízes de direito o ato tão difícil e, muitas vezes cruel, de julgar o que é certo ou errado nesta vida.

Um abraço e um beijo desmedido e completamente irracional para todos vocês; amores da minha vida.

Teus Olhos... (meus olhos)



Teus olhos têm uma cor
de uma expressão tão divina,
tão misteriosa e triste.
Como foi a minha sina!!!

É uma expressão de saudade
vagando num mar incerto.
Parecem negros de longe...
Parecem azuis de perto...

Mas nem negros nem azuis
são teus olhos meu amor...
Seriam da cor da mágoa,
se a mágoa tivesse cor.

Eu ...
Eu sou a que no mundo anda perdida,
Eu sou a que na vida não tem norte,
Sou a irmã do Sonho,e desta sorte
Sou a crucificada ... a dolorida ...

Sombra de névoa tênue e esvaecida,
E que o destino amargo, triste e forte,
Impele brutalmente para a morte!
Alma de luto sempre incompreendida!...

Sou aquela que passa e ninguém vê...
Sou a que chamam triste sem o ser...
Sou a que chora sem saber porquê...

Sou talvez a visão que Alguém sonhou,
Alguém que veio ao mundo pra me ver,
E que nunca na vida me encontrou!

Amar!
Eu quero amar, amar perdidamente!
Amar só por amar: Aqui... além...
Mais Este e Aquele, o Outro e toda a gente
Amar! Amar! E não amar ninguém!

Recordar? Esquecer? Indiferente!...
Prender ou desprender? É mal? É bem?
Quem disser que se pode amar alguém
Durante a vida inteira é porque mente!

Há uma Primavera em cada vida:
É preciso cantá-la assim florida,
Pois se Deus nos deu voz, foi pra cantar!

E se um dia hei-de ser pó, cinza e nada
Que seja a minha noite uma alvorada,
Que me saiba perder... pra me encontrar...

Poemas de Florbela Espanca (uma menina também)

sábado, 7 de janeiro de 2012

Para sempre

Espero-te

Espero-te
Quero-te caindo em mim,
 chuva grossa e pesada,
úmida realidade que alimenta
as possibilidades de minha insanidade.
Apesar de querer-te tão imediatamente
quanto possa o pensamento conceber,
espero-te com lenta ansiedade.
Nesta deterioração inerente a todo ser
guardo-te
aguardo-te
resguardo-te
com meus pés no presente
e a mente muito além.

Meu Senhor

Quis fugir de ti, meu conquistador
fugir da tua língua metálica
de tuas ásperas consoantes ressoantes
de tua sonoridade pragmática
de teu silêncio por mim.
Pensei-me capaz de esquecer
Esquecer-me de meus sentimentos
de meu desejo atlântico e imoral
de meu inadequado amor de besta
de minha paixão por ti.
Mas, como se pode esperar que
a comum mariposa
tenha forças para virar as costas para a luz
de uma estrela?

quinta-feira, 5 de janeiro de 2012

Luto


Com as mãos nuas apertei-lhe
o pescoço
com  toda a força, a dor e o medo
que conheço.
Apertei até que parasse de gritar,
até sufocar todos os seus sonhos,
fantasias
e desejos.
Assim morreu minha alma,
estrangulada por minhas mãos.
E o  coração tornou-se músculo,
e os olhos tornaram-se mecanismos
sensíveis apenas à luz,
e a pele passou a ser apenas um
órgão que protege a carne da gente.
Sigo oca pelo mundo
num luto eterno
pelo meu amor
que morreu.