segunda-feira, 31 de outubro de 2011

Carlos Drummond de Andrade (31 de Outubro de 1902)

    Amar
Que pode uma criatura senão,
entre criaturas, amar?
amar e esquecer,
amar e malamar,
amar, desamar, amar?
sempre, e até de olhos vidrados, amar?

Que pode, pergunto, o ser amoroso,
sozinho, em rotação universal, senão
rodar também, e amar?
amar o que o mar traz à praia,
e o que ele sepulta, e o que, na brisa marinha,
é sal, ou precisão de amor, ou simples ânsia?

Amar solenemente as palmas do deserto,
o que é entrega ou adoração expectante,
e amar o inóspito, o áspero,
um vaso sem flor, um chão de ferro,
e o peito inerte, e a rua vista em sonho, e uma ave de rapina.

Este o nosso destino: amor sem conta,
distribuído pelas coisas pérfidas ou nulas,
doação ilimitada a uma completa ingratidão,
e na concha vazia do amor a procura medrosa,
paciente, de mais e mais amor.

Amar a nossa falta mesma de amor, e na secura nossa
amar a água implícita, e o beijo tácito, e a sede infinita.



Carlos Drummond de Andrade © Graña Drummond
Feliz Aniversário ao meu primeiro Carlos, o Drummond,
neste dia em que nasceu a poesia em Itabira há 109 anos atrás.

domingo, 30 de outubro de 2011

O silêncio


Ando a aprender, como tu mo dirias,
que há silêncios que são mais duros
e mais pesados do que outros.
Há o silêncio que diz muito,
e o outro cheio de sentidos duplos.
Há o silêncio de quem concorda ou consente,
e aquele de quem sente, mas prefere calar
por medo, vergonha ou zelo.
E há o terrível silêncio do fim,
aquele que cala  voz e  alma.
Aquele que só aprendemos como soa
depois de dizermos adeus
a quem nos fez sorrir.

quarta-feira, 26 de outubro de 2011

sHe

EstagNada


 Deixo-me aturdida
como cidade muda, quieta
morta.
de mortes onde as cores se perdem
onde perdem-se os movimentos
e a única palavra que ressoa é:
 estagnada
água parada,
 podre,
turva da sujeira que nela se acumula
pela falta de ação.
Poça sem possibilidades.

terça-feira, 25 de outubro de 2011

Come Together (right now over me)

Come Together

The Beatles

Here come old flattop, he come grooving up slowly
He got joo-joo eyeball, he one holy roller
He got hair down to his knee
Got to be a joker he just do what he please

He wear no shoeshine, he got Toe-Jam football
He got monkey finger, he shoot Coca-Cola
He say "I know you, you know me"
One thing I can tell you is you got to be free

Come together right now over me
He bad production, he got walrus gumboot
He got Ono sideboard, he one spinal cracker
He got feet down below his knee
Hold you in his armchair you can feel his disease

Come together right now over me
Right
He roller-coaster he got early warning
He got muddy water, he one mojo filter
He say "one and one and one is three"
Got to be good-looking 'cause he's so hard to see

Come together right now over me

Something that makes sense with no sense at all. My motto!

sexta-feira, 21 de outubro de 2011

Coração Míope


Um amigo muito querido sempre brinca comigo a respeito do tipo de homem que me interessa, dizendo em alto e bom tom (bem, o tom não é tão bom assim) que o que me atrai mesmo é gente feia. Eu rio, claro. Mas a verdade, é que dar-lhe razão não seria algo tão sem sentido assim, já que é fato que gosto mesmo de homens diferentes. Gente que a maioria classificaria como estranha ou feinha mesmo; que me desculpem todos os afetados por esta declaração tão franca assim, porém a beleza nunca me atraiu muito não. Assim como os olhos, tenho míope o coração.
A verdade é que ainda hoje não consigo definir o que me atrai nos homens, o que me faz perder a razão. Sei apenas que há alguns poucos pré-requisitos indispensáveis que nem são tão difíceis de ver por aí. Ele deve ser alto, moreno, mulato ou negro (desculpem-me todos os loirinhos de olhos azuis) e ter uma personalidade meio torta, ser complicado mesmo, cheio de defeitos por fora e por dentro, um ser difícil de compreender e impossível para se conviver; bem... Assim... Assim... Como eu, não? Ok, ok, é verdade que se ele mostrar-se inteligente e sensível a coisa fica deveras complicada, e beira ao piegas mais brega que pode existir. Adoro um drama, nasci para o teatro, eu sei.
Brincadeiras à parte, a verdade é que aquilo que os olhos vêem não faz jus aos sentimentos possíveis para o coração que vê muito além da pele e da carne que podemos com os dedos sentir. Uhhh, aposto que os meninos de plantão já devem ter torcido o nariz pensando: que louca, claro que a beleza é importante sim. E o prazer? E o tesão que se sente quando um corpo fantástico está ali, ao nosso lado, e vem de pronto aquele pensamento: que delícia! (risos e risos). Eu sei como é isso, já tive meus momentos e sei quão bons eles podem ser. Contudo, não é isso que faz ser humano algum se apaixonar. Isso não.
Então, o que faz com que sintamos algo que nos faz perder a razão? Por que quebramos nossas próprias regras, e fazemos coisas que juramos para nós mesmos que jamais faríamos? Quando é que nos perdemos mergulhados nos sentimentos? Claro que eu não tenho a resposta para esta perguntita, e acho mesmo que esta não deverá nunca ser encontrada, pois, que graça haveria daí? Não senhor, que fique cá o mistério preso em nossa alma e ponto final. Sou uma mulher romântica afinal, quem o diria, hein?
Eu, que me apaixonei por motivos tão particulares como um olhar de soslaio, uma barba negra e misteriosa de pirata, os olhos verdes e brilhantes que me viram de repente e, por fim, a voz deste homem que parece me acompanhar por toda vida, aprendi que o importante não é descobrir o que nos faz sentir assim, mas apenas nos permitir assim sentir. Por isso, desejo a todos vocês que se apaixonem sinceramente por alguém sem medo ou pudor. Ah, vale apaixonar-se outra e outra vez pela mesma pessoa ou várias vezes por pessoas diferentes, ok? Eu sei que pode doer, contudo, valerá cada pequeno momento, mesmo!
Um beijo apaixonado para todos vocês,
meus queridos amigos.

quinta-feira, 20 de outubro de 2011

O castanho


olhos castanhos como os de tantos que passeiam pelas ruas
têm cor de terra, madeira, chá e mel
eles são os meus, os deles e os teus,
olhos de brancos, negros, ocidentais e orientais
todos eles e todos nós somos iguais
mais claros com a luz do dia ou quando a emoção nos contagia
escuros, quase pretos com o desespero, o sofrer e ao sol se esconder
não são da cor do céu ou do mar, pobres olhos comuns
aos quais não dão valor algum
olhos castanhos meus queridos vira-latas, olhos sem raça
são doces como o chocolate, o pão de mel e a avelã,
café e Coca-cola de manhã
vejo os nos rostos cheio de segredos, olhos de guerreiro,
 velhos orixás, índios, e samurais
trazem amor e ritmo a minha vida,
meu samba.

terça-feira, 18 de outubro de 2011

uma falciosa noção de Intimidade


by Carlos Nobre - Algodão

miragem

somos tão iguais aos outros e aos uns
uns e outros
aqueles ou estes, tanto faz
não há nada de especial em mim
ou em ti
eu sou igual a tantas outras, mais uma
e tu não és único como crê o coração
isso tudo, eutueleseaqueles
são simplesmente o mesmo
e, apenas eu quero provar
que a alma existe
e, por isso vejo
tu e eu
como um par nascido,
o um para o outro,
os dois em um.

segunda-feira, 17 de outubro de 2011

o Amor

 

Última vez

quantas vezes já menti para mim?
ninguém deveria mais acreditar nas palavras
rotas e frouxas
que saem das minhas mãos,
da boca:
a última vez que escrevo para ti,
que te envio poemas que não fazem
nenhum sentido, que te ligo.
mas a última deixa de  o ser
outra e outra vez,
pois o medo de perder-te me afoga
na mesma medida
que a coragem me grita: crê, prossegue.
e a última vez passa a ser mais uma,
uma e outra, mais e mais um pouco
de tudo que ainda está aqui,
dentro desta mulher sem freio e sem regras,
que uma ou duas, (talvez cerca de cinco vezes?),
tenha dito que este seria o fim: a última vez.

Eco

De novo, outra vez
Agora, sim?
Nunca, nada,
Ninguém me fará desistir. Então,
Mais uma tentativa, sim?
Vamos repetir, repetir e repetir
Até que possamos dizer: agora sim!

As vantagens da miopia cardíaca

Se Deus te deu defeitos, se há coisas que mereciam ser refeitas,
eu não as vejo.
O mal humor, o insistente cigarro, a falta de tato
e o egocentrismo exacerbado, não vejo.
Nasci míope, de uma forma rara, patologia bem vinda em mim,
sofro de miopia cardíaca e amo-te mesmo torto e
cheio de defeitos,
pois visto de dentro do meu peito,
parece-me perfeito.

Pa' ti mi negro.

quarta-feira, 12 de outubro de 2011

Os Filhos do Coração (Feliz Dia das Crianças pra Mim)

Lucas


Pedro
Apesar de eu não os ter feito, de talvez eu não saber fazer-los
Deus me deu filhos mesmo assim
Amor incondicional
passional
irracional
Amor que durará para além da minha vida aqui
Meus filhos do coração
são a razão de toda a felicidade
que vive em mim.

quarta-feira, 5 de outubro de 2011

Steve Jobs (1955 - 2011)

Hoje morreu um dos gênios de nossa época, um homem que via o futuro e realizava nossos desejos antes mesmo que nós os pudéssemos imaginar. Aquele que transformou a maça de Newton num ícone moderno: simples e ao mesmo tempo fantástico...



A man who taught us that we can and must
Think Different

iMiss you

terça-feira, 4 de outubro de 2011

A língua


Quero de ti a bruta língua
ignorante e iletrada
e por tanto viva
quero a tua língua de carne
dentro de mim
muda, sem palavras
sem dizer nada
usada para aquilo que
deveria ser seu único fim
quero a língua crua
nua
tua
a descobrir sítios escondidos
dentro de mim
para ti, meus olhos

O sabonete Íntimo

Eu e algumas amigas, muitos e muitos anos atrás.

Já há um bom tempo sinto certo estranhamento todas as vezes que começo o meu banho. Não é nada de foro íntimo, apesar da intimidade ser parte afetada em toda a coisa. Lá estou eu, a gastar mais água do que deveria, quando olho para o lado e, invariavelmente, lá está ele: o sabonete líquido íntimo. Sim, porque de uns anos para cá, nós mulheres nos sentimos desprotegidas caso o tal sabonete íntimo não esteja ali ao lado de seu irmão mais velho, o velho sabonete usado para o corpo inteiro. O que me faz pensar: Como vivi tantos anos sem este senhor que cá está se o tal respeita e serve para equilibrar o meu PH genital?  Meu Deus, eu lá sou um aquário para ter que ter o meu PH equilibrado? A tal música de Fagner, onde ele queria ser um peixe, fez mais sentido na minha vida do que fizera até este dia.
A verdade é que vivi muitos anos sem o tal sabonete íntimo, mas hoje não consigo voltar do mercado sem ele, o que me faz pensar sempre: Por que complicamos tanto a vida assim dando mais importância às coisas do que às pessoas? Quando foi que começamos a nos preocupar mais com cremes que esticam as rugas do que com os amigos que nos fazem rir até chorar e as reforçam? Que sentido faz, afinal, uma vida assim tão plástica, mas sem muito sentido já que a evitamos em prol de uma complexa e, ao mesmo tempo, vazia? Esquecemos que as coisas não têm importância alguma, eu também me esqueci disto, e passamos anos de nossas vidas focados em ganhar mais dinheiro porque precisamos comprar mais coisas do que faziam as nossas avós.
Sim, porque se antes meus vizinhos tinham nome para mim, hoje já não sei quem são porque mal os vejo. Dá-me saudade da época em que um telefone era apenas um telefone e não tinha que ter nome e sobrenome pra mim, do tempo que roupa podia ser qualquer uma desde que fosse bonita e confortável e que conhecíamos a dona da loja onde íamos comprar-la, uma senhora japonesa a qual chamávamos de Dona Maria. Não me lembro quando comecei a dar nomes aos objetos e a esquecer que apenas os nomes das pessoas deveriam ter importância para mim. Assim, deste jeito tão impessoal, o mundo me parece grande e vazio demais e eu, que ando saudosista ao extremo (deve ser reflexo da idade que avança a passos largos), lembrei de pessoas que fizeram parte de um mundo confortavelmente menor e mais aconchegante.  Um mundo onde o verdureiro tinha nome, o Expedito. Um lugar aonde o carteiro, o Jesus, vinha de vez em quando visitar-nos para partidas de voleibol no fim de semana, e o bar da esquina não era qualquer um, mas o do Sr. Japonês cujos filhos brincavam conosco na rua todas as tardes depois da escola.
O tempo passou e jamais voltará atrás, eu sei, eu sei. Então resta-nos aprender a viver com este que aqui está. Eu sei também. Entretanto, vale à pena colocar as coisas em seus devidos lugares de quando em vez, não? Não prometo deixar de usar o tal sabonete famigerado, acho que este hábito já é mais forte do que eu. Mas creio que devo tentar esquecer um pouco as coisas e preocupar-me mais com as pessoas que dão, para mim, o único sentido que a minha vida pode ter.
Um beijo saudoso e quentinho para todos, e um abraço tão longo quanto os discursos do Fidel. Boa semana!

domingo, 2 de outubro de 2011

O milagre

 

Ele me pergunta coisas
que apenas crianças sabem perguntar
e, por estes dias
 me perguntou:
o que é um batizado madrinha?
mas, por mais que eu me esforçasse
com todos os meus rasos conhecimentos
teológicos,
não consegui explicar-lhe
que raios era  a tal
 água benta
para além de uma água
abençoada por Deus.
assim, com esta explicação confusa
de adulto, deixei na mente do
meu pequeno mais dúvidas.
então, veio a tal descabida,
e por isso mesmo preciosa,
questão: e vamos poder ver Deus na igreja?
não, não o veremos, mas poderemos
sentir-lo, respondi eu.
e desliguei o telefone
sem dizer-lhe que vejo o meu Deus,
que posso mesmo ver-lo,
 a sorrir-me
sempre que tenho a ele,
meu menino Pedro,  perto de mim.
porque assim, olhando nos olhos dele,
vejo face a face o amor
vivo na minha frente.