quarta-feira, 29 de março de 2017

O teu Beijo (Beija Eu)



O teu Beijo


Beija eu, beija eu, me beija...

Porque de todos os beijos desta vida

o único que eu realmente queria

é o seu; que é meu.

E que um beijo apenas não seria,

pois, como você muito bem o diria:

este seria um assombro devastador.

A verdade que jamais poderá ser escrita ou falada tal como

por ti

é o meu amor.

Um beijo teu seria tudo meu Preto, é tudo,

que eu queria.



Um poema feito de pedaços, palavras ditas por outros, por mim e por ti.


domingo, 26 de março de 2017

Vergonha


Vergonha


Sentir orgulho e ou vergonha por pertencer a qualquer país, raça, religião e ou por qualquer outra característica física sempre me pareceu uma ideia um tanto torta. Afinal, devemos ser avaliados e medidos por nossas ideias e ações, por nossa capacidade de sentir empatia por todas as outras pessoas e coisas vivas nesse planeta.  Tão distantes da perfeição quanto de outras galáxias e, portanto, cientes de que as falhas de caráter são inerentes à nossa existência; mesmo assim ou por isso mesmo, a capacidade de amar aos outros e a tudo que nos cerca deveria ser o único índice a medir nosso valor, não?

 Seja como for, a noção de nacionalismo para além do amor que sentimos por nossa terra como o lugar ao qual conhecemos desde o berço e onde nos sentimos completamente em casa, soa-me como um sentimento preconceituoso por sua natureza. Ser brasileira ou americano, japonesa ou inglês, sul-africana ou iraniano e etc. e tal jamais definirá muito, ou quase nada, sobre o caráter da pessoa em questão e, consequentemente, pouco nos dirá sobre o respeito que devemos a essa ou aquela pessoa.

Contudo e, (mais uma vez) mesmo assim, ando a sentir-me tremendamente envergonhada de ser brasileira. Pois, apesar de saber que não somos um amontoado de pessoas iguais e que ser brasileiro não significa seguir a um determinado padrão de comportamento apenas por nosso nascimento ao sul do equador, sinto-me assim: acabrunhada por minha natureza. Isso não está certo, sei que não. Porém, simplesmente, não posso evitá-lo.

Como não sentir vergonha a pertencer a um país cheio de riquezas no qual muitos cidadãos são classificados como homens e mulheres de valor inferior e vivem à margem do que chamamos sociedade? Por que temos tanto e aceitamos que outros possam viver com quase nada? O que sentir ao ver claramente que nossa classe política, o funcionalismo público, nossos empresários ou, em suma, aparentemente todo e qualquer brasileiro corrompe ou é corruptível e tem como meta de vida ter muito dinheiro e poder mesmo que isso signifique a desgraça de toda uma nação?

Pois bem, não sei o que deveríamos sentir; o que eu deveria sentir, fazer ou crer nessa situação. Não sei. Sei apenas que me sinto envergonhada de ser brasileira. Nada mais.

sexta-feira, 24 de março de 2017

Pronomes


Pronomes


De um repente, feito golpe na nuca, chega-me,

numa tarde chuvosa,

a completa compreensão de quem sou;

de quem fui por anos e anos a fio.

Um erro da língua portuguesa!

Horas, dias, meses e anos dedicados à insensatez

de construir, parva e cega,

uma gramática para a minha ilusão;

a minha mais querida e acalentada ilusão sobre

como deveriam ser utilizados os pronomes eu e você.

Equivocada na construção pronominal, utilizei em tantas frases

o nós certa de que esta era a forma precisa para expressar

tamanha comoção que aqui e aí havia. Interpretação falhada; eu sei.

Assim, nunca me dei conta,

de que em nossas contas sem somas,

o plural jamais poderia ter sido utilizado para comunicar um sentimento

manco que, atinando à realidade

e a bem da verdade,

só existe aqui.


domingo, 19 de março de 2017

O Espelho



O Espelho

Ana observava seu reflexo no espelho do quarto há alguns minutos naquela ensolarada manhã fria de inverno. Lá fora tudo era movimento. Um gato pardo caminhava sobre os muros verdes da casa onde algumas flores teimosas ainda resistiam agarradas às trepadeiras que cobriam o acinzentado cimento do qual o muro era feito. Um pássaro cantava na mangueira sem frutos e podiam ser adivinhados os pensamentos famintos do gato. Na rua alguns meninos brincavam com uma bola, e João escrevia no jardim.

Apenas Ana estava estática por instantes naquele dia claro e pacato que contrastava agudamente com o pavor que nela instalara-se. Naquela manhã Ana acordou e percebeu que não se reconhecia mais no espelho. Aquela mulher que a sua frente cismava não era ela. Tudo nela parecia distinto do que fora na noite anterior e, por mais que ela buscasse compreender o que via a sua frente, na verdade não o podia fazer. Quando ocorrera tal mudança? João terá notado tal transformação silenciosa? Ela pensava.

Aqueles olhos não eram os seus, como não era sua aquela boca muda e sem clara definição na porção inferior da face. O nariz crescera, os olhos diminuíram e o queixo tinha perdido o seu ar de quem tudo sabia; decidido e cheio de autoridade. Tudo naquela face parecia para Ana uma mancha indefinida que se diluía n’água enquanto ela a fitava. Aquele rosto era uma massa mal esculpida e pouco, quase nada, refletia a face que a ela pertencia.

Depois de alguns minutos paralisada, angustiada, Ana inclinou-se para limpar o espelho com a manga da blusa de seu pijama azul turquesa. Ele estava sujo. Ele deveria estar sujo. Sim, pensava ela, a sujeira causou tal deformação e enganou aos meus olhos míopes e sonolentos. Afinal, nenhuma transformação profunda como essa ocorreria da noite para o dia. Nenhuma.

Ana limpou a superfície do espelho com calma e dedicação. Lenta e suavemente, quase com carinho, ela passava o tecido que cobria seu antebraço sobre o espelho.  Certa de que aquela ação a tudo mudaria, Ana dedicava-se com atenção ao ato que traria de volta o rosto que sempre havia sido seu. O rosto que ela tão bem conhecia e que a agradava apesar de não ser mais bonito do que a maioria de todos os rostos que por ela haviam passado durante a vida. Não importava para ela a beleza ou a falta dela em seu rosto. Importava-a o fato de que nele, e apenas nele, ela era capaz de reconhecer-se.

Ana sentou-se novamente de olhos postados ao chão; quase fechados. Respirou com calma por dez vezes como fazia para baixar o ritmo do coração depois de uma corrida e olhou-se mais uma vez no espelho. João entrou no quarto e sorriu para ela com um doce bom dia dito sem aflições. Ana virou-se de costas para o espelho e sorriu.

segunda-feira, 13 de março de 2017

Coisas de Menina...




Baiana

Baiana cê me bagunçou
Pirei em tua cor nagô, tua guia
Teu riso é Olodum a tocar no Pelô
Dia de Femadum, tambor alegria
Cê me lembra malê, gosto pra valer
Dique do Tororó, Império Oió
A descer do Orum, bela Oxum
Cujo igual não há em lugar nenhum
O branco da areia da Lagoa de Abaeté
Tá no teu sorriso, meu juízo perde o pé
O canto da sereia vem de boa, eu à toa é
Prejuízo, pretinha briso nesse axé

A cabeça ficou louca
Só com aquele beijinho no canto da boca
Louca, louca, louca
Só com beijin', um beijin'
Minha cabeça ficou louca
Só com aquele beijinho no canto da boca
Louca, louca, louca
Só com beijin', um beijin'

Baiana é bom de ter aqui
Na Salvador de cá, Salvador dali
Maria pela mão de mestre Didi
Do sol de escurecer o tom dos Kariri
É o mito em Iorubá, bonito pode pá
Água de Amaralina, gota de luar
Deleite ocular, rito de passar
Me lembrou Clementina a cantar
2 de Fevereiro, dia da Rainha
Que pra uns é branca, pra nóis é pretinha
Igual Nossa Senhora, padroeira minha
Banho de pipoca, colar de conchinha
Pagodeira em linha da Ribeira, eia, Cajazeira
Baixa do tubo tudo, firme e forte na ladeira
Uma pá de cor, me lembrou Raimundo de Oliveira
Meu coração, tua posição, a primeira

A cabeça ficou louca
Só com aquele beijinho no canto da boca
Louca, louca, louca,
Só com beijin', um beijin'
Minha cabeça ficou louca
Só com aquele beijinho no canto da boca
Louca, louca, louca,
Só com beijin', um beijin'

terça-feira, 7 de março de 2017

Noturna



Noturna
 
Não há nada de novo na noite
Venha cá, não há nada a temer
Pode ser que o silêncio te escute
E no escuro você possa ver

É só relaxar
É só se entregar
Não se preocupar
É bom pra pensar em nada, em nada
Deixar pra amanhã
Deixar pra depois
É bom se lembrar de respirar de novo, de novo

Não há nada de novo na noite
Venha cá, não há nada a temer
Pode ser que o silêncio te escute
E no escuro você possa ver

É só relaxar
É só se entregar
Não se preocupar
É bom pra pensar em nada
Em nada
Deixar pra amanhã
Deixar pra depois
É bom se lembrar de respirar de novo
De novo

É só relaxar
É só se entregar
Não se preocupar
É bom pra pensar em nada, em nada
Deixar pra amanhã
Deixar pra depois
É bom se lembrar de respirar de novo, de novo

Não há nada de novo na noite

domingo, 5 de março de 2017

Saudade



Saudade é coisa séria. Algo feito de uma matéria indestrutível, à prova do tempo e que existe em todo lugar neste mundo de meu Deus. Sentimento inerente à existência humana, pois não há ser humano normal que passe a vida toda a desconhecê-la. Com o passar dos anos a saudade que acompanha-nos, irmã siamesa que brota d’alma da gente, alimenta-se e cresce à medida que, pela vida, mais e mais gente faz parte de quem somos nós.  Como bem disse John Donne: “Ninguém é uma Ilha isolada... A morte de qualquer homem diminui-me.”.

Sim, apesar de sermos indivíduos únicos, seres unitários, quiçá sempre sozinhos pelo caminho, somos também a combinação de todos que fazem, fizeram e farão parte de nossas vidas: nossos pais, filhos, irmãos, amigos, vizinhos; o menino que conheci numa noite rara e que me pareceu um amigo de longa data de cara. Daniel tinha um lindo sorriso.

A verdade é que com o tempo vamos somando pedaços dos outros a quem somos, à la Frankenstein, e construímos uma vida baseada numa porção enorme de outras vidas que nos fazem uma falta danada. Então, a falta de tempo de estar com os outros nos chateia, as brigas nos magoam porque afastam quem queremos bem, os quilómetros que nos separam são uma sentença de desterro de nós mesmos. Sentimos saudade; muita saudade.

Como todo sentimento, saudade não pode ser medida realmente. Podemos dizer que é muita ou pouca, eu sei. Porém mesurá-la com exatidão é ciência que não foi descoberta ainda e, por isso, não é possível dizer de quem sentimos mais falta. Não existe isso. Como também não é verdadeiramente possível dizer com clareza a quem amamos mais. Amamos muito a muitos e pronto; ponto.

Contudo, e porque eu acho divertido e saudável contradizer a mim mesma, há dias em que uma ou outra falta aperta mais o peito. Mais do que deveria ser.  Pois, por esses dias ando com uma saudade aguda da Mima; saudades de dizer oi para ela e poder ouvi-la responder. Saudade de ti, Mima.

À Lucy e sua Mamis.



'No Man is an Island'

No man is an island entire of itself; every man
is a piece of the continent, a part of the main;
if a clod be washed away by the sea, Europe
is the less, as well as if a promontory were, as
well as any manner of thy friends or of thine
own were; any man's death diminishes me,
because I am involved in mankind.
And therefore never send to know for whom
the bell tolls; it tolls for thee.

John Donne


quinta-feira, 2 de março de 2017

O Salto



O Salto

Sempre mais,
mais do que deveria ser,
mais do que pede o bom-senso;
o desprezível bom senso,
sinto.
Sem meio termo, desconheço o valor do que é mediano,
o medíocre,
e espero tudo por inteiro. Cheio e irracional, o verdadeiro prazer.
Mergulho de cabeça no que não conheço, sem cordas de segurança,
paraquedas ou
ideias pré-concebidas do que deveria ser o certo nesta vida,
quero o que desconheço.
E assim espero que comigo mergulhe a todo aquele que me acompanha:
amigos
pares
amores
parceiros...
Lado a lado e sem medo em relação ao que pode vir,
de olhos abertos, quero ver tudo aquilo que um dia ousou existir
pois tudo tem o seu espaço aqui,  em mim.
Entretanto, não é assim que as coisas funcionam regularmente.
Regularmente, para os mais adequados à vida, há um freio instalado desde a fábrica;
item básico na maioria dos modelos.
Um travão n’alma que impede o voo dos sentimentos e
que garante a acomodação ao que manda
o siso (substantivo criado pelo Ministério dos que têm, mais que vontade, medo).
Então, pensando-me acompanhada, pulo sozinha em direção ao nada
para realizar, apenas no meio do salto em meio a imensidão,
que dada à minha
não há nenhuma outra mão.