Perdi meus cadernos e sinto-me órfã,
daquelas orfandades onde faltam partes de si.
Perdi-os, mãe desnaturada e relapsa, e agora me resta
o lamento de quem sabe que errou,
que percebe a dimensão universal de seu crime.
Eles andam pelo mundo, e o assombro de que o mundo
possa andar por eles me apavora.
Nos cadernos há partes de mim que nunca foram vistas,
os profundos segredos obscuros de uma alma fingidora.
Neles reside, em absurda concomitância, o que de mais
belo,
um dia, houve em mim.
Perdi-os.
Perderam-se 
                   em
aviões que partiram antes que eu a eles pudesse retornar.
Perderam-se 
   em mudanças de
casa, 
           apesar de
eu tê-los guardado numa caixa,
como muitos dos objetos que se perdem 
nestas ocasiões 
          por criarem
pernas.
Perdi-os, e sinto que tenho filhos meus perdidos,
pois partes de mim andam por este mundo completamente
alheios a mim.
Perdi-os, e sinto-me perdida.

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